Uma bem-vinda dose de magia e encantamento
por Francisco RussoDesde que a Disney resolveu adaptar suas consagradas animações em versões live-action, o estúdio do Mickey tem variado entre apresentar cópias fiéis (Cinderela, Mogli) e verdadeiras revoluções com os personagens (Malévola, Meu Amigo, O Dragão). Por mais que este novo A Bela e a Fera esteja mais próximo da primeira opção, chama a atenção o quanto os roteiristas Stephen Chbosky e Evan Spiliotopoulos ampliaram a história conhecida, não apenas explicando certas pontas soltas como trazendo material inédito. Este, no fim das contas, é um dos destaques do novo filme - mas não o único.
Extremamente luxuoso, A Bela e a Fera de imediato salta aos olhos graças ao requinte na direção de arte e figurinos. Se por um lado há o nítido esforço em recriar a ambientação do filme de 1991 - a primeira animação indicada ao Oscar de melhor filme, é sempre bom lembrar -, por outro o diretor Bill Condon & cia entregam situações inéditas, que exigiram uma boa dose de criatividade não apenas na criação, mas também para adequá-las à narrativa clássica sem que houvesse perdas ou um certo desnível. Afinal de contas, são 45 minutos de cenas extras em relação à animação, uma quantidade considerável.
Dentre as novidades, há quatro canções inéditas e um esforço em explicar melhor não apenas a transformação da Fera (Dan Stevens, irreconhecível debaixo de tantos efeitos especiais), com direito ao porquê de seus empregados também terem sido amaldiçoados, mas também o passado dos dois personagens-título. A conexão entre Bela e seu pai, Maurice (Kevin Kline, correto), é também fortalecida, assim como a crueldade inicial da Fera é, de certa forma, suavizada. Entretanto, é importante ressaltar que nada disto foi incluído em detrimento da história da animação. Praticamente tudo o que estava lá aparece também nesta nova versão, em alguns momentos reprisando diálogos e cenas à exatidão. O que, é claro, também facilita muito na identificação junto ao público, que guarda com carinho na memória afetiva o filme e suas canções. É como se, de antemão, o novo A Bela e a Fera já entrasse em campo com o jogo ganho.
Muito também pela bela escalação do elenco. Emma Watson é daquelas escolhas cirúrgicas, combinando precisamente com a personagem pelo tipo físico e o simbolismo que automaticamente traz consigo, seja pela dedicação a frente de causas feministas ou pelo próprio passado cinematográfico na pele de Hermione Granger, da série Harry Potter. Entretanto, quem realmente brilha em cena são Luke Evans e Josh Gad, intérpretes de Gaston e LeFou. Se Evans traz ao seu vilão a necessária mistura de egocentrismo e canastrice que tão bem combinam com o personagem, cabe a Gad uma certa revolução em cena, já que seu LeFou traz um delicioso - e corajoso - subtexto envolvendo o desejo reprimido por Gaston. Nada explícito (em atos), mas coerente sobre o relacionamento de ambos e contundente em relação à representatividade, algo que a Disney vem trabalhando já há alguns anos, em filmes como Zootopia, Moana, Star Wars - O Despertar da Força e Rogue One. Ponto para a casa do Mickey, pela ousadia e também pela implementação tão divertida de tal proposta.
Por mais que não atinja a excelência da animação, muito graças ao trabalho mais simples de recriar algo já existente e ao menor impacto na paixão crescente entre Bela e a Fera, a versão live-action garante ao espectador uma bem-vinda dose de magia e encantamento. Em parte impulsionada pelas lindas canções da animação, pelo apuro na elaboração da ambientação - destaque para a graciosidade da sequência em que Bela surge pela primeira vez, bastante parecida com a do filme de 1991 - e também pelas novidades presentes nesta versão, trazendo frescor a uma história tão conhecida. Destaque também para o elenco de apoio formado pelos objetos mágicos, extremamente carismáticos, pelo belo design encontrado para o guarda-roupa e para a inserção da divertida cena do sapateado na canção dedicada a Gaston, criada para a versão de A Bela e a Fera para a Broadway. Belo filme, capaz de agradar aos fãs e conquistar novos por reverenciar o passado sem se tornar refém dele.