As Power Rangers da autoajuda
por Renato HermsdorffEm um badalado concurso internacional de música, a Rússia é representada por um casal cujo homem da relação é um gay enrustido (bem, nada discreto). Dada a recente perseguição do governo russo aos homossexuais, a opção pode ser encarada como uma alfinetada à administração de Vladimir Putin. Perspicaz, não? (Na verdade, nem tanto). Esse é o mais alto nível de sutileza que você encontrará em Cupcakes - Música e Fantasia.
Diretor declaradamente gay, o cineasta israelense Eytan Fox, responsável por Delicada Relação e Bubble (ambos de teor homossexual) resolve, com o novo filme, investir na comédia escrachada. Cupcakes conta a história de um grupo de amigos em Israel que é fã do tal concurso cafona.
Na noite da competição, eles se reúnem para assistir ao festival pela TV quando Dana (Dana Ivgy), que é confeiteira (daí o título), revela que o marido foi embora de casa. Para animá-la, os amigos, liderados por Ofer (Ofer Shechter, o único homem, gay, da turma de cinco mulheres, que ganha a vida animando crianças de uma creche travestido de mulher) compõe uma canção. Sem o conhecimento das meninas, ele inscreve a música no concurso do ano seguinte. E eles são selecionados.
Se ganhassem um voto do júri para cada clichê que o filme apresenta, o grupo não só entraria no concurso como campeão, como garantiria a posse do troféu pelo menos para a próxima década. Os personagens são rasos, não têm uma nota de profundidade, e as situações são de um lugar comum tão frequente, que desanimam mesmo o espectador mais bem intencionado. “Ok, AdoroCinema”, você pode argumentar, “trata-se de uma comédia”. Mas, exatamente por ser tão vazio e previsível, também não tem graça nenhuma.
Cada um dos integrantes do grupo, que são vizinhos, faz um “tipo”. Ofer vive um conflito com o namorado, enrustido por ser de família rica (patrocinadora do programa) e conservadora. Dana é a dona de casa em crise porque o marido a abandonou; tem a lésbica que toca violão; a bonitona que quer ser vista como mais do que um corpinho desejável; a menina pobre que não pode correr o risco de desviar seu caminho; a jornalista e blogueira patinho feio.
O filme chega a ponto de – sem que haja uma combinação entre os personagens, ou seja, sem função dramatúrgica aparente – vesti-los com uma determinada e exclusiva cor predominante. Assim, por exemplo, tem a que sempre está com uma peça vermelha (a abandonada), um casaquinho amarelo (a bonitona); uma blusinha azul (a pobre), uma sainha verde (a jornalista) e por aí vai. É um recurso quase infantil de identificação. As Power Rangers da autoajuda.