Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Romance à Francesa

Ciranda dos solitários

por Bruno Carmelo

Clément (Emmanuel Mouret) é um professor tímido, fascinado pela estrela do teatro Alicia (Virginie Efira). Ele assiste às peças dela dezenas de vezes, sonhando em namorá-la. Um dia, isso acontece: os dois se conhecem, ela gosta do fã, nasce uma paixão e logo o casal está morando junto. Essa poderia ser uma história de amor completa, mas em Romance à Francesa, é apenas o começo, pois o roteiro parte da felicidade para desconstrui-la. Com a vida afetiva estabelecida, Clément conhece a imprevisível Caprice (Anaïs Demoustier), que faz de tudo para conquistar o professor.

O diretor e ator Emmanuel Mouret sempre gostou de pessoas desajustadas, desenvolvendo neste projeto um quadrado amoroso entre elas. O melhor amigo de Clément, o professor Thomas (Laurent Stocker), apaixona-se por Alicia e decide comunicá-la de seu afeto. O texto, portanto, não esconde seu caráter de farsa: os personagens se apaixonam e se separam, se encontram e se perdem com a facilidade própria ao universo burlesco. Aliás, a cidade de Paris é retratada como um microcosmo onde existem apenas as quatro figuras, sempre prontas a cruzar umas com as outras pelas ruas. Mouret gosta de situações absurdas, mas aprecia ainda mais a noção de destino.

Para criar a dinâmica do grupo, ele escolhe quatro atores de estilos distintos: a versátil e técnica Anaïs Demoustier constrasta com o estilo menos expressivo de Virginie Efira; o humor corporal do premiado Laurent Stocker, da Academia Francesa, está muito distante dos olhares exagerados e clownescos do próprio Mouret. A princípio, este parece ser um grupo que nunca estaria junto, tanto pelos atores quanto pelos personagens, mas o cineasta usa a improbabilidade a seu favor: eles parecem ainda mais inaptos socialmente quando confrontados uns aos outros. Mesmo assim, existe uma evidente ternura do roteiro por cada um desses personagens carentes e, no fundo, um tanto tristes.

Romance à Francesa (tradução genérica para o original “Caprice”) se destaca pelo posicionamento libertário em relação ao amor e ao sexo, permitindo reconfigurações leves e descontraídas dos casais, incompatíveis com a moral cristã. Mouret elabora um filme solar, de cores claras, personagens gentis e diálogos afiados. Os enquadramentos seguem a cartilha clássica e, como em A Arte de Amar, o cineasta encontra sua melhor dinâmica dentro dos apartamentos e espaços fechados, onde a câmera estabelece jogos de gato e rato entre os amantes nos diversos cômodos.

É uma pena que o imperativo do classicismo leve o roteiro a adotar uma reviravolta grave, pouco condizente com a leveza anterior, antes de terminar com um improvável otimismo, resolvendo todos os conflitos numa voz off explicativa e providencial. O filme é muito hábil ao complicar as vidas de seus personagens, mas não demonstra a mesma destreza na hora de resolvê-las. Fosse concluída com o sarcasmo que a situação mereceria, a obra seria digna das antigas comédias de Woody Allen. Pela escolha feita, o tradicional final feliz enfraquece a construção de personagens tão avessos à tradição.