Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Infância

Filme-memória

por Lucas Salgado

Domingos Oliveira é um diretor diferente. De clássicos como Todas as Mulheres do MundoEdu, Coração de Ouro a obras mais recentes como CarreirasJuventude, o cineasta sempre tratou de temas que abordassem sua vida pessoal. Certa vez, Federico Fellini afirmou: “Toda a arte é autobiográfica, a pérola é a autobiografia da ostra." O ícone da nouvelle vague fez uma generalização, mas uma coisa é certa: toda obra de Domingos é autobiográfica. Algumas mais do que as outras. Infância, por exemplo, é claramente autobiográfica, uma vez que conta uma história inspirada em lembranças da infância do diretor.

Versão para as telonas da peça Do Fundo do Lago Escuro, o longa acompanha Rodriguinho (Raul Guaraná), um garoto que era o favorito de seu avô. Ele mora com os pais e a avó em uma grande mansão no Rio de Janeiro. Estuda em casa e volta e meia recebe a visita do primo, com quem não se dá muito bem. Gosta mesmo de sua cachorra e fica muito preocupando com seu desaparecimento. O que ele não sabe é que esta morreu após comer naftalinas que a avó deixava espalhadas pela casa.

Fã de Carlos Lacerda, a avó Dona Mocinha (Fernanda Montenegro) controla a casa, deixando os cuidados do dinheiro com o genro (Paulo Betti). Ela é uma figura autoritária e determinada a ditar os rumos das vidas dos filhos vividos por Ricardo KosovskiPriscilla Rozenbaum. Domingos, que escreve e dirige o filme, também faz uma breve, mas bela, participação como ator.

Apesar de se conhecerem há 50 anos, Domingos e Fernanda trabalham juntos pela primeira vez no cinema. E o diretor tem muito a agradecer, afinal a atriz é a alma do filme, entregando uma atuação complexa que une bem o drama e o humor. Trata-se de uma figura autoritária, mas de certa forma doce, principalmente na forma como tenta manter a família junta.

O elenco adulto está bem. Além dos citados, Nanda CostaMaria Flor surgem em breves participações. Quem compromete mesmo são os atores mirins. Rodriguinho e Ricardinho são personagens desinteressantes e mal desenvolvidos. Se não fosse a boa contextualização de época e o trabalho incrível de Fernanda, o espectador tinha tudo para desistir do filme diante de atuações tão sem conteúdo.

Infância é o filme mais bem produzido de Domingos em muitos anos, contando com bons trabalhos de direção de arte e figurino. Trata-se de uma obra delicada, um filme de sutilezas. Fosse mais coeso e menos formalmente quadrado, poderíamos estar diante de um longa bem superior.