2 + 2 = 3,5
por Renato HermsdorffDemolition é dirigido por Jean-Marc Vallée, cineasta responsável por arrancar performances fora do comum de seus atores, reconhecidas, inclusive, pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. São dele, por exemplo, Clube de Compras Dallas (2013), Oscar de melhor ator para Matthew McConaughey e coadjuvante para Jared Leto; também é o nome por trás de Livre (2014), que rendeu indicações para Reese Witherspoon e Laura Dern.
Com o novo filme, ele conta a história de Davis Mitchell, um investidor que perde a esposa em um trágico acidente de carro. Nos primeiros minutos do filme, numa eletrizante sequência de abertura, o casal está conversando sobre questões domésticas até que, bum, a vida se esvai em questões de segundo.
Para protagonizar a produção, foi escalado Jake Gyllenhaal, que vem adicionando boas atuações (O Abutre, de 2014; O Homem Duplicado em 2013) ao currículo. Juntando dois (diretor) e dois (ator), no entanto, o resultado não é exatamente o esperado.
Não é que Gyllenhaal não segure o papel. Jake encontra um tom convincente para dar vida a Davis, mas trata-se de um protagonista sem a mesma força dos personagens dos filmes mais recentes do diretor.
A reação imediata de Davis à tragédia é a indiferença, até que ele encontra uma primeira maneira de expurgar o fantasma nas cartas que passa a escrever para o serviço de atendimento ao cliente de uma companhia responsável por uma dessas máquinas de venda automática de produtos – a segunda forma é quebrar tudo, do desmonte de eletrodomésticos à marretada em parede, daí o título.
Na mesma noite em que a esposa falece, ainda no hospital, Davis insere as moedas, mas seu M&M de amendoim fica preso no arame. Do outro lado da linha (postal) está Karen Moreno (Naomi Watts, subaproveitada), a responsável pelo SAC que se comove com o drama do rapaz e, de maneira “não profissional”, passa a se corresponder com ele.
A partir daí, os dois desenvolvem uma relação que faz do filme honesto, mais pelo poderia ser, do que pelo que é de fato. Explicamos: diferente do que se poderia esperar, os dois não engatam – necessariamente – um relacionamento amoroso. O elo passa mais pela cumplicidade, afinal, o problema de Davis é de outra ordem (ele precisa viver o luto).
Ela, aliás, tem um filho, um “garoto de 15 que aparenta ter 12” (vivido pelo ator Judah Lewis). Davis passa a ser uma espécie de mentor involuntário às avessas do moleque, o que não é exatamente original (Um Santo Vizinho segue por esse caminho, por exemplo), mas revela-se divertido.
Demolition é um filme “rock´n´roll”, incluída aí a trilha, que faz lembrar o Vallée do ótimo C.R.A.Z.Y. - Loucos de Amor (2005). O roteiro, que não é lá essas coisas, ganha forma e corpo sobretudo com uma montagem baseada em rápidos flashbacks da esposa – reais ou não – que conferem um tom criativo de fantasia ao filme.
No entanto, a produção escorrega em clichês tão banais quanto inacreditáveis, dada a experiência do time por trás do longa. Corridinha entre pássaros na praia? Cabaninha com jogo de sombras dentro do apartamento? É, tem.
O resultado é que o filme, de visual interessante, não engrena como era de se esperar. Talvez seja mesmo uma questão de expectativa. Uma matéria inevitável quando alguém se depara com dois e dois na sua frente e tem que fazer a soma.
Filme visto no 40º Festival Internacional de Cinema de Toronto, em setembro de 2015.