Críticas AdoroCinema
1,5
Ruim
Ensaio

Chorando e amando

por Bruno Carmelo

Ensaio é um filme romântico. Com apenas meia dúzia de personagens, ele consegue construir uma dezena de histórias de amor: todos em cena estão apaixonados uns pelos outros, às vezes por mais de uma pessoa, de maneira profunda e passional. Enquanto a música clássica confere um tom triste, a diretora Tânia Lamarca cria uma quantidade surpreendente de cenas com personagens chorando nos bastidores de um teatro, enquanto observam à distância o seu grande amor sobre o palco. A intenção é mostrar artistas como pessoas perturbadas, que “amam demais” e só se completam dançando, compondo ou escrevendo, por exemplo.

Mais do que resgatar uma visão romântica e muito antiga do artista, Ensaio explora a moral básica do melodrama, de que amar é sofrer, de que todo amor parece o único, de que paixão não tem fronteiras etc. etc. etc. Estamos em um território de pouca racionalidade: todas as pessoas se entregam cegamente à dança e ao amor, sem refletir. Esta é a essência novelesca de um filme pautado por suor, lágrimas, risos, gritos. Existe igualmente um pano de fundo histórico, com alguns ensinamentos didáticos sobre a história de Anita Garibaldi, mas o foco encontra-se de fato na trama de amor.

No caso, os principais apaixonados são Eva (Lavínia Bizotto) e Daniel (Bruno Cezario), dois dançarinos que preparam juntos um espetáculo. Como o filme acredita que a arte é um reflexo direto do estado de espírito do artista, os dois se movem com intensidade e desejo. Bizzotto e Cezario dançam muito bem, e as coreografias poderiam render belos momentos em tela, mas a diretora e o montador infelizmente optam por versões bastante picotadas das performances de Eva e Daniel. É difícil assistir a uma imagem de ambos juntos por mais de cinco segundos: logo surge uma câmera lenta, um flash, um insert rápido, uma voz over para embaralhar os sentidos. A edição dança mais que os dançarinos.

Aliás, por que tantos cortes, tantas inserções, tantas imagens que se assemelham ao delírio, enquanto os encontros entre o diretor da companhia (Chico Caprario) e seu irmão limitam-se à textura naturalista da imagem digital? Por que algumas atuações são realistas (Ingra Liberato) e outras beiram o caricatural, a comédia pastelão (o próprio Caprario)? Por que inserir um pseudo documentário dentro do filme, se o elemento nunca é explorado a fundo? E o que dizer do subtexto sobre a história da Argentina, introduzida sem relações com o resto da trama?

O que mais incomoda em Ensaio é sua incoerência, tanto temática quanto estética. Lamarca parece ter concebido seus planos na hora de filmá-los, sem ter uma visão única para o conjunto. Este drama parece ser o fruto de uma produção desorganizada, que reúne à força uma direção pouco assertiva, uma montagem afobada, atuações em descompasso e um trabalho de edição de som pouco competente. Provavelmente, o resultado final de Ensaio não corresponde ao objetivo inicial de ninguém, e a colcha de retalhos final fica muito distante da bela intenção de homenagear o amor e a arte.