Indivíduos além de instituições
por Lucas SalgadoResponsável por obras que ficam na cabeça como A Concepção e Se Nada Mais Der Certo, o diretor José Eduardo Belmonte não havia se saído muito bem em sua estreia no cinema mais comercial, realizando a fraca comédia Billi Pig, com Selton Mello e Grazi Massafera. Agora, faz uma nova tentativa em um filme de ação: Alemão. O resultado é um pouco melhor, principalmente pelo fato do diretor não perder tempo tentando ser um novo Tropa de Elite ou Cidade de Deus.
O cineasta apresenta o cenário social e político do Rio de Janeiro, com o surgimento das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) e a eleição para cidade-sede das Olimpíadas de 2016, mas foca sua atenção em seus personagens e em três histórias de amor, sendo que uma envolve pai e filho.
Branco (Milhem Cortaz), Samuel (Caio Blat), Carlinhos (Marcelo Melo Jr.), Danilo (Gabriel Braga Nunes) e Doca (Otávio Müller) são policiais que trabalhavam infiltrados no Morro do Alemão, no Rio, pouco antes da invasão da polícia e do exército em 2010. Eles têm suas identidades reveladas e são obrigados a se esconderem dos traficantes que ainda dominam o local.
Boa parte da trama é passada no porão de uma pizzaria e a sensação de claustrofobia, fomentada pela inquietude e pelo desespero dos personagens, é impressionante. Os cinco atores oferecem atuações marcantes, com destaque para o mais desconhecido (Melo Jr.) e para a dupla Cortaz e Blat, dois dos maiores atores do cinema brasileiro na atualidade.
Do lado do tráfico, o elenco é liderado por Cauã Reymond como o chefe do morro Playboy. O ator não compromete, mas seu personagem tão pouco é complexo o suficiente para roubar espaço dos protagonistas. Antonio Fagundes e Mariana Nunes completam o elenco.
Além de muita ação, o longa conta com dois romances bem interessantes. Um entre um dos policiais e a irmã de um criminoso e outro entre Playboy e uma ex-namorada. A outra história de amor citada acima é entre o pai delegado (Fagundes) e o filho infiltrado (Blat). Eles pouco contracenam juntos, mas a preocupação do pai com relação ao filho é tocante, principalmente por causa da grande atuação de Fagundes, que volta a trabalhar com o produtor Rodrigo Teixeira pouco após Quando Eu Era Vivo.
A dinâmica entre os personagens é muito boa e as atuações também. Destaca-se ainda o fato do longa não oferecer heróis, chegando a apresentar algumas críticas à polícia. No entanto, há um problema claro de discurso. Ainda que faça tais ressalvas, o longa termina quase como uma propaganda do sistema de segurança pública carioca, apenas para nos créditos apresentar algumas imagens dos protestos de 2013, mostrando um outro lado da polícia. Ficou clara a impressão de que tais imagens não estavam previstas quando o filme foi concebido e acabaram na obra como uma forma de amenisar a posição chapa-branca.
Outro grave problema do filme é sua trilha sonora. Nem tanto a seleção musical, que oferece alguns funks, mas sim a trilha instrumental. A música assume a função de dramatizar algumas cenas e acabou roubando espaço das atuações. Em determinado momento, a trilha chega a impedir que o público escute o diálogo, o que é absurdo.
Alemão está anos-luz de bombas como Assalto ao Banco Central, mas também está muito distante de ser uma obra-prima. A intenção de fugir de crítica às instituições para focar nos indivíduos é interessante, mas poderia ter sido tomada sem deixar lacunas.