Críticas AdoroCinema
1,5
Ruim
Reza a Lenda

Vazio

por Francisco Russo

Não é de hoje que o cinema brasileiro busca diversificar sua produção, de forma a não ficar dependente única e exclusivamente das comédias e dos dramas de fundo social. Nos últimos anos até têm surgido algumas iniciativas no cinema de gênero, especialmente suspense e ação, mas quase sempre esbarrando em fórmulas prontas vindas do cinema hollywoodiano, sem a necessária pitada tupiniquim que permita que o espectador não apenas acredite, mas se reconheça na telona. Reza a Lenda, longa-metragem de estreia de Homero Olivetto, é mais um a tentar este caminho - e, também, mais um a fracassar.

Vendido como o "Mad Max nordestino", Reza a Lenda faz jus à fama - ao menos visualmente. A imagem do sertão sem fim imediatamente transmite as sensações de vastidão e isolamento, tão importantes para esta narrativa. O clima inóspito ganha força também a partir da trupe de motoqueiros liderada por Ara (Cauã Reymond, burocrático), mal vestidos e sempre imundos de poeira, devido à vida constante na estrada. Lembrou dos filmes mais antigos da franquia de George Miller, com Mel Gibson como protagonista? Pois é, a ideia é exatamente esta.

Diante de tamanha preocupação com o visual, ficam explícitas as ligações do diretor com a publicidade. Filho de Washington Olivetto e ele mesmo responsável por várias campanhas, Homero traz para o filme o olho clínico habitual da atividade, que preza a imagem acima de tudo. É (também) por isso que o filme entrega longas sequências contemplativas, onde se pode acompanhar os personagens principais vagando de lá para cá, ou de cá para lá, sem que nada de fato aconteça, mas sempre ao som de uma trilha sonora pulsante. Tudo muito bonito, mas também vazio.

Entretanto, o grande problema de Reza a Lenda é que, por mais que até traga uma ambientação interessante, falta conteúdo ao longa-metragem. O fiapo de roteiro gira em torno de duas histórias intrínsecas: uma jovem (Luisa Arraes, sempre assustada) perdida no mundo que precisa viver com a gangue de Ara, meio contra sua vontade meio por falta de alternativa melhor, e o duelo entre o motoqueiro e o vilão Tenório (Humberto Martins, caprichando na carranca de malvado) pela posse da estátua de uma santa. Ambas bastante superficiais, com personagens pra lá de estereotipados.

Quem insinua uma certa esperança em meio a cenário tão desolador - de inóspito e também de desinteressante - é Severina, personagem de Sophie Charlotte. De semblante forte, bem diferente dos papéis já interpretados pela atriz, ela logo destoa pela presença de uma mulher decidida em um ambiente tão masculinizado. Entretanto, o roteiro não perde tempo em desperdiçar seu potencial ao colocá-la em uma disputa amorosa por Ara - e apenas isto! A decisão de associar as duas principais personagens femininas na trama a uma reles disputa pelo macho alfa não apenas soa preguiçosa, como também preconceituosa - ainda mais em tempos de Furiosa (de Mad Max: Estrada da Fúria) e Rey (de Star Wars - O Despertar da Força) mostrando que há mais para as mulheres em cena do que apenas brigar entre si pelo amor alheio.

Com personagens tão mal construídos, fica a sensação de desperdício. Ainda mais diante do pífio aproveitamento de Júlio Andrade e Jesuíta Barbosa, atores de potencial que aqui são meras caricaturas. No fim das contas, Reza a Lenda se sustenta apenas no apuro visual, especialmente fotografia e figurino, esquecendo que o cinema exige mais do que apenas imagem.