Um belo filme de moda
por Renato HermsdorffTal qual Johnny & June (e Sr. e Sra. Smith?), Yves Saint-Laurent, o filme, bem que poderia se chamar Yves & Pierre. A cinebiografia do estilista francês, em cartaz nos cinemas, foca a conturbada relação amorosa entre o artista e Pierre Bergé, responsável por administrar sua carreira. (Com a diferença de que Saint-Laurent nasceu para subir; e Bergé para preparar a escada, como o personagem admite, sem crises, no filme de Jalil Lespert).
Preciso na reconstrução de época, o longa francês acompanha duas décadas da vida de Yves Saint-Laurent. De 1957, quando, com apenas 21 anos, assume a direção artística da maior maison de alta-costura da época, a Dior, passando pela abertura da própria grife, até o auge, com um belo desfile em 1976. Com a riqueza de detalhes que se espera de uma produção como essa, o filme não decepciona – pelo contrário – na direção de arte, impecável, nem no figurino, que promete causar frisson entre os amantes da moda.
Estão lá a modelo Victoire Doutreleau (papel de Charlotte Le Bon), a guinada na carreira com a coleção Mondrian, o primeiro encontro com a musa Betty Catroux (Marie de Villepin), a subversão do feminismo da "mulher Yves Saint-Laurent" desafiadora da década de 1970. Mas o destaque mesmo é a interpretação e caracterização dePierre Niney (As Neves do Kilimanjaro, Rindo à Toa) na pele do protagonista. É no tom de voz e na postura que o jovem ator investe para criar um personagem consistente, sem dúvida crível, em sua timidez característica.
Mas, se tecnicamente, o filme desfila bem pela tela, é no roteiro que ele quebra o salto. Além de não se aprofundar nas questões caras ao personagens – ok, o estilista era genial, mas como seu trabalho foi alçado a tal categoria não é explicado no longa; a convocação para a guerra pelo seu país (YSL nasceu na Argélia) é confusa; mesmo os tropeços na carreira são apenas pontuados –, logo de cara Lespert se vale de uma solução pouco cinematográfica, a narração em off, de maneira pobre.
O filme começa com Bergé (Guillaume Gallienne, muito bem no papel) nos dias de hoje, relembrando o passado, como se falasse diretamente para um Yves Saint-Laurent que não está mais entre nós (o estilista morreu em 2008). E aí é um tal de “você encontrou as cores em Marrakech”, “naquele ano, você adoeceu”, fez isso, deixou de fazer aquilo. Convenhamos: nos episódios da vida de Saint-Laurent, o próprio estava presente, de modo que o espectador pode se sentir lesado em sua inteligência quando se abusa de tal recurso.
Yves Saint-Laurent, o estilista, teria dito: “a moda passa; o estilo é eterno”. Yves Saint-Laurent, o filme, é belo, sem dúvida. Como a moda.