Conto da carochinha
por Francisco RussoSejamos honestos: desde que despontou como revelação em 1997, por O Doce Amanhã (pelo qual ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes e duas indicações ao Oscar), o diretor Atom Egoyan nada mais faz do que decepcionar a cada novo trabalho. Ok, em sua filmografia até há alguns filmes interessantes, como Ararat e Verdade Nua, mas a média geral é de uma ausência de frescor impressionante. Pois, com À Procura, Egoyan chegou ao ápice: ao misturar o cinemão convencional com uma história pra lá de mirabolante, o resultado é uma bomba daquelas difíceis de mensurar.
A história começa seguindo a trilha clássica dos suspenses convencionais: uma garotinha desaparece do carro do pai, em meio a uma nevasca, quando ele para por minutos para fazer uma rápida compra no mercado. Sem pista alguma do que aconteceu nem a menor ideia de onde ela esteja (ou até se está viva), a tragédia destrói o casamento dos pais. Paralelamente, uma detetive engajada se dedica a tentar elucidar o caso. Seis anos depois, eis que uma pista aparece. A garota está viva e integra uma complexa rede de pedofilia (!). Mais ainda: ela ajuda a convencer crianças a entrarem no esquema, através da internet (!!). Continuando: apesar de viver em cativeiro, não aproveita as chances que tem de escapar e ainda por cima pode acompanhar um pouco da vida dos pais através de câmeras meticulosamente escondidas na casa deles (!!!).
Se você já acha esta história meio estranha, saiba que há ainda o outro lado da trama, envolvendo a tal policial dedicada, interpretada por uma esforçada Rosario Dawson. Ícone da busca por jovens desaparecidos, ela agora mantém um romance com outro policial, o sempre apático Scott Speedman, e se vê às voltas com o tal maníaco que sequestrou a garotinha. Interpretado por quem? Kevin Durand, em mais um de sua extensa galeria de vilões. Aliás, não é nem preciso aguardar alguma explicação mais detalhada, a caracterização de Durand é tão caricata, repleta de maneirismos e estranhezas, que de imediato se reconhece nele o vilão. Ainda mais com seu currículo tão pouco diversificado.
Em meio a uma trama tão mirabolante, não apenas pelos rumos que toma mas pelas próprias lacunas deixadas no roteiro, À Procura se perde por completo. Atom Egoyan tenta fazer de seu filme um suspense comercial e, para tanto, apela para os mais variados tipos de clichê de forma a criar uma falsa tensão. O resultado é um filme confuso, também pelo roteiro fugir um pouco da linearidade, e de situações tão absurdas que ao espectador resta apenas rir. Para completar, há Ryan Reynolds, mais perdido do que nunca e caprichando no olhar tristonho enquanto vagueia em busca da filha, e um desfecho tão simplório que, ainda por cima, contrasta com a imensa capacidade da organização demonstrada até então. Um dos piores filmes lançados em 2014.
Filme visto no 67º Festival de Cannes, em maio de 2014.