Sem corpo nem alma
por Lucas SalgadoE a Vida Continua... é o típico exemplo de cinema que não deveria ser feito. Não pelo cunho religioso, mas sim pela falta de qualidade e pelo desrespeito ao espectador. Não há qualquer cuidado com a obra. O roteiro é mal desenvolvido, as atuações péssimas, a trilha sonora irritante e por aí vai. Isso, infelizmente, tem sido cada vez mais comum nos chamados "filmes espíritas".
Bezerra de Menezes - O Diário de um Espírito, Nosso Lar e As Mães de Chico Xavier são longas que deixam de lado a oportunidade de contar uma bela e interessante história para se entregar a uma fórmula preguiçosa que só visa os números nas bilheterias. Os filmes citados tinham, pelo menos, boas atuações (Carlos Vereza em Bezerra de Menezes e Nelson Xavier em As Mães de Chico Xavier) ou efeitos técnicos de qualidade (Nosso Lar), mas E a Vida Continua... não tem nada disso. Não coloco Chico Xavier - O Filme na mesma condição dos outros, uma vez que, apesar da direção conservadora de Daniel Filho, é de fato uma obra melhor desenvolvida.
Escrito e dirigido por Paulo Figueiredo, E a Vida Continua... traz péssimas performances de Amanda Acosta, Luiz Baccelli e, principalmente, Luiz Carlos Felix. Como era de se esperar, Lima Duarte é quem se sai melhor no elenco, mas recebe um papel tão ruim e é colocado em situações tão ridículas que não é possível aproveitar o que poderia ser uma grande atuação. O ator é colocado como uma espécie de mestre Jedi do espiritismo, com direito a aparecer em nuvens brancas para dizer palavras de sabedoria.
O filme pode incomodar aqueles que não seguem o espiritismo, afinal são tratados com ignorantes e pouco instruídos. Mas também deveria desagradar aqueles que seguem a religião, tendo em vista o pouco cuidado diante da obra original.
Um dos principais defeitos da produção está na mixagem de som. O longa apresenta as diálogos de forma deslocada do som ambiente. Na verdade, temos a impressão de estarmos vendo um filme mal dublado da Sessão da Tarde. É normal a utilização da dublagem pelos próprios atores, principalmente quando o diretor não fica satisfeito com a captação direta, mas é necessário que o diálogo inserido posteriormente respeite o som ambiente e não apareça como único elemento em cena.
A dublagem mal inserida acaba reforçando as péssimas atuações. Como destacado acima, Luiz Carlos Felix acaba chamando a atenção de forma ruim. Ele interpreta o canastrão Caio, que trai sua esposa Evelina (Acosta) mesmo com ela acometida de um tumor. Ele faz o tipo vilão e acaba tendo o objetivo de receber para si todo o desgosto do espectador. É importante não culparmos apenas o ator, uma vez que o papel em si é muito ruim.
Outro personagem importante é Ernesto (Baccelli), que também é bem prejudicado pelo roteiro. Trata-se um sujeito amargurado com a vida que acaba de aproximando de Evelina pelo fato de também estar doente. O filme "resolve" seu trauma no passado de forma simplória, que acaba provocando risos no público. Falando em risos, tratar algumas situações como comédia acaba sendo uma solução para fazer da obra algo menos intragável.