Beleza técnica
por Lucas SalgadoPremiado no Festival do Rio de 2011, A Hora e a Vez de Augusto Matraga chega aos cinemas quatro anos depois da primeira exibição após uma série de problemas de distribuição. Na ocasião, o longa havia sido premiado como Melhor Filme do evento pelo júri oficial e popular. A expectativa era de um bom resultado comercial nos cinemas. Com o atraso, o filme chega sem impacto ao circuito. Ainda assim, quem for conferir irá se deparar com uma bela produção, de muito apuro técnico e grandes atuações.
O grande risco do longa é ser comparado ao clássico A Hora e Vez de Augusto Matraga (1966), obra absolutamente fabulosa dirigida por Roberto Santos e estrelada por Leonardo Villar e Jofre Soares. Restaurado recentemente, o filme conta com tomadas muito ousadas para sua época, sendo um dos grandes ícones do Cinema Novo.
A "sorte" do novo longa está no fato de que existe toda uma geração - na verdade, duas ou três - que não tem conhecimento da obra original, inspirado em conto homônimo de Guimarães Rosa. Sem a comparação, a nova produção ganha ainda mais força. A direção é de Vinícius Coimbra, em sua estreia em longas após uma carreira na TV.
Augusto Matraga (João Miguel) é um violento fazendeiro do sertão de Minas Gerais que descobre que sua esposa (Vanessa Gerbelli) foi levada por um rival da região (Werner Shunemann). Ele vai atrás de vingança e acaba batendo de frento com o Major Consilva (Chico Anysio). Matraga é cercado pelos capangas do major e acaba espancado e dado como morto. Mas é resgatado por um casal de idosos e tentará retomar sua vida sem a violência de antes.
O elenco conta ainda com as ótimas participações de José Wilker, José Dumont, Júlio Andrade e Irandhir Santos. Wilker e Anysio, que vieram a falecer antes do lançamento da produção, surgem em participações duras e bem desenvolvidas, mas o destaque da produção vai mesmo para João Miguel. O ator, que já havia brilhado em obras como Cinema, Aspirinas e Urubus, Estômago e outras, entrega uma performance marcante e muito complexa. Ele dá vida a um personagem perturbado pelo passado, com momentos de brutalidade e outros de espiritualidade.
A Hora e a Vez de Augusto Matraga conta com um vigor técnico impressionante. A direção de fotografia de Lula Carvalho, que contou com a assistência do pai Walter Carvalho, é primorosa, seja pela beleza das tomadas abertas ou pela sutileza dos planos-detalhe. Outro destaque é a utilização de uma fotografia mais granulada, que remete aos clássicos faroestes americanos. A direção de arte, o figurino e a maquiagem também merecem destaque, bem como a trilha sonora de Sasha Amback, que usa e abusa de temas de Tom Jobim, que caem como uma luva no cenário do filme.