Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
O Quarteto

Comédia + drama

por Bruno Carmelo

Imagine as maiores estrelas da música, após a aposentadoria, reunidas em uma mesma casa, reservada apenas a grandes artistas. A premissa é improvável, devido à batalha de egos e à situação financeira confortável destas personalidades, mas o potencial cinematográfico da ideia é grande. Dustin Hoffman, em sua estreia na direção de longas-metragens, prefere não explorar todas as possibilidades da história, e sim oferecer um filme leve, despretensioso, baseado no equilíbrio entre drama e comédia.

Do quarteto do título, dois músicos encarregam-se da parte cômica, e dois deles cuidam da parte dramática. Billy Connolly interpreta um senhor libidinoso, que se comunica apenas com tiradas irônicas e piadas de conotação sexual. O ator está visivelmente à vontade com este material, e compõe sem esforços o personagem mais divertido do filme. Pauline Collins fornece sua contribuição no papel de uma mulher ingênua, com crises de amnésia, mas sempre disposta a ajudar. Nenhum dos dois ajuda no desenvolvimento da narrativa (eles não têm conflitos próprios), mas eles atribuem a comicidade desejada a cada cena.

Já o drama é gerado por Maggie Smith e Tom Courtenay, interpretando um casal desfeito há décadas. Os dois se apaixonaram, se separaram e agora se reencontram nesta casa. Durante pelo menos 30 minutos, eles se perseguem, esbarram-se nos corredores, olham com remorso um para o outro. É curioso pensar que o cinema contemporâneo está repleto de tramas sobre a convivência comunitária e artística de idosos (Young @ Heart, Song for Marion), geralmente assombradas pela proximidade da morte. No entanto, em O Quarteto, a morte parece distante, improvável. O drama nasce unicamente das feridas amorosas do casal.

Infelizmente, este romance é a parte mais fraca do filme, porque aparece sem contexto, e é superado com uma facilidade espantosa. Em uma cena, Reginald (Courtenay) pensa em abandonar a casa para não ter que olhar para Jean (Smith), mas alguns minutos mais tarde eles já conversam pacificamente. Nada é muito realista nesta interação. Além disso, a atuação de ambos é tensa, rígida, deixando pouco espaço à compaixão do espectador. Mas como o roteiro segue a cartilha das comédias românticas, você pode imaginar exatamente o final otimista que a trama reserva aos dois.

Já a música funciona apenas como coadjuvante na trama. Hoffman fez questão de colocar músicos reais como figurantes, mas esta preocupação é mais simbólica do que efetiva. Canta-se pouco, toca-se ainda menos. O quarteto principal, que teria se tornado famoso com uma interpretação magistral de Rigoletto, nunca revela seus dotes vocais atuais, durante a velhice. Mesmo os ensaios para o aguardado recital são mostrados sem som, criando grande expectativa para a prestação final dos quatro personagens juntos, no palco. (Neste sentido, a solução criada por Hoffman para a última cena é bastante surpreendente).

Apesar destas reservas, a parte cômica, muito mais regular e constante do que a dramática, consegue conferir ao conjunto uma atmosfera lúdica. Hoffman pode não ter conseguido criar uma obra memorável e inovadora, mas certamente orquestrou bem o tom fluido da produção. Com a presença de bons atores coadjuvantes (Michael Gambon, Sheridan Smith) e diálogos afiados, típicos do cínico humor britânico, O Quarteto é uma obra simples, previsível e um tanto irregular, mas ainda assim bastante agradável.