Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Tomorrowland - Um Lugar Onde Nada é Impossível

Tudo é possível?

por Francisco Russo

O sonho de qualquer publicitário é criar para uma marca – qualquer marca – uma associação tão forte que seja imediatamente lembrada pelo público ao menor resquício que seja. Para tanto, muitas vezes explora conceitos abstratos, de forma a trazer para o produto a sensação por eles produzida. Esta intenção foi brilhantemente apresentada no drama chileno No, indicado ao Oscar 2013 de melhor filme estrangeiro, ressaltando o caso da campanha contra a continuidade do ditador Augusto Pinochet, relacionada com o retorno da alegria. No caso da Walt Disney Pictures, há muitas décadas existe a associação ao mundo da fantasia e ao prazer lúdico que ele traz. Tomorrowland - Um Lugar Onde Nada é Impossível explora justamente este conceito, de forma até abusiva.

Há no longa-metragem a clara intenção de ressaltar a esperança em detrimento do cinismo, o bem vencendo o mal, que há meios de consertar o planeta. Este baluarte atende pelo nome de Casey Newton, a adolescente que acredita que tudo é possível. Do outro lado há Frank Walker, já adulto, que perdeu a esperança após muito ver (e sofrer). A mensagem de que os jovens podem mudar o mundo e ressuscitar valores enterrados é explícita, mas nem um pouco ingênua. Por trás das boas intenções, há uma intenção publicitária muito bem definida, que fica escancarada no trecho em que mostra a infância de Frank. Em uma hábil ação de merchandising, a entrada para o mundo mágico de Tomorrowland é associada a um dos brinquedos mais populares dos parques da Disney, It’s a Small World – aquele do passeio de barco ao som da canção “é um mundo bem melhor, todo feito pra você...”. Ou seja, a Disney te leva ao mundo dos sonhos, literalmente.

Diante disto, Tomorrowland não é simplesmente um filme, mas também um produto para vender ao público o mundo mágico da Disney e, mais ainda, catequizá-lo. É bem verdade que todo candidato a blockbuster procura capturar o público de tal forma que possa atraí-lo para mais e mais sequências (ou spin-ofs, ou prelúdios, ou refilmagens), além de vender todo tipo de produto relacionado. Aqui, a intenção é mais abrangente, pela incisiva proposta publicitária implícita ao próprio roteiro. Filme de propaganda, em outras palavras.

Apesar deste conceito até mesmo malicioso, em contraponto à própria proposta do filme, é importante ressaltar que Tomorrowland não é um filme ruim. Deixando de lado questões ideológicas (e mercadológicas), o filme oferece uma aventura interessante envolvendo os dois personagens centrais, Casey e Frank. Há um clima de mistério sobre o tal mundo fantasioso e desconhecido que resulta em sequências divertidas envolvendo clichês da própria ficção científica, como robôs malvados, armas superpoderosas e invenções inusitadas. Entretanto, esta mesma história é bastante prejudicada pela abertura do filme, que retrata a infância de Frank. Além de ser bastante artificial e até desnecessária, com direito a ecos de Rocketeer, ela traz várias informações prévias que diminuem bastante o impacto do que ocorre quando Casey e Frank enfim se encontram.

Por outro lado, o roteiro oferece alguns momentos inspirados, como a boa sacada da situação atual da NASA, bem menos poderosa do que no auge da guerra fria, e o subtexto referente à manipulação da mídia, já perto do fim do filme, que encontra um paralelo na própria realidade brasileira. São estas pequenas boas ideias dentro da narrativa apresentada que minimizam o impacto negativo trazido pelos 20 minutos iniciais, com a tal infância de Frank.  

Em relação às atuações, tanto Britt Robertson quanto George Clooney cumprem o trivial. Ela assume bem a função de girl next door, a garota que você encontra na esquina, assim como Clooney encarna a figura do homem amargurado e solitário. Quem tem um brilhareco é a jovem Raffey Cassidy, mais pelas mudanças de conceito pelas quais passa sua personagem, Athena.

No fim das contas, Tomorrowland é um filme bastante problemático pelas questões que aborda, tanto pela mensagem embutida quanto pelo lado comercial implícito. Quando se resume a apenas trazer uma aventura de ficção científica, até funciona bem. Mas, como o lado publicitário não deixa esquecer, há vários outros interesses em jogo além de uma mera mensagem otimista sobre o futuro da humanidade.