Realidade carioca
por Francisco RussoPor décadas, a imagem do Rio de Janeiro que chegava às pessoas era de uma cidade extremamente violenta, com uma polícia corrupta e um Estado que se omitia em diversas regiões. A implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) veio tentar alterar este quadro, com relativo sucesso. Fato é que o índice de criminalidade caiu na cidade como um todo e a pacificação de favelas e comunidades fez com que os imóveis próximos a estas áreas voltassem a ser procurados, um fenômeno também impulsionado pela proximidade da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Entretanto, como é o funcionamento de uma UPP? De que forma ocorre a interação entre moradores e policiais? Qual é o preço pago pelos envolvidos para que um projeto deste porte saia do papel? 5x Pacificação tenta responder estas e várias outras perguntas ao longo de 96 minutos.
O grande mérito do documentário é justamente ser um painel amplo sobre o assunto. Se há o lado de glorificação, com entrevistas com o governador Sérgio Cabral e o secretário de segurança José Maria Beltrame, há também críticas ao projeto, vindas de moradores que não estão plenamente satisfeitos com a nova realidade. Entretanto, é entre estes extremos que o filme melhor trabalha. A partir de vários relatos de moradores, policiais, sociólogos e ex-traficantes, é apresentada a complexidade de uma iniciativa deste porte, não apenas pelo lado administrativo e de implementação mas também pela mudança no paradigma existente até então. Não é graças à presença de UPPs por alguns anos que impressões marcadas ao longo de décadas serão apagadas, assim como as próprias UPPs não são, por si só, a solução de todos os problemas. Esta consciência, fugindo tanto da glorificação quanto da crítica pura e simples – mas sem excluir ambos -, faz do filme uma espécie de estudo sociológico formado a partir do dia a dia dos entrevistados, dando força à proposta implementada.
Outro ponto positivo vem justamente das origens dos quatro diretores do longa-metragem. Rodrigo Felha, Cadu Barcellos, Luciano Vidigal e Wagner Novais vêm de comunidades e conhecem bem sua realidade, assim como a difícil relação com a polícia. Desta forma, eles descartam o lado idílico da proposta – "vamos trazer civilidade às favelas!" – e os discursos positivos ensaiados para conferir, na prática, as mudanças reais trazidas pelas UPPs. As experiências pessoais dos diretores ganham espaço na tela, não apenas pela presença deles diante das câmeras como também a partir de relatos comparativos, como os de Rodrigo Felha ao visitar o local onde os futuros policiais são treinados.
Por outro lado, 5x Pacificação conta com alguns problemas técnicos que atrapalham seu bom andamento, especialmente na captação de áudio. Em certos trechos é tão difícil compreender as falas das pessoas que a própria produção assumiu a tarefa de pôr legendas para que o espectador pudesse compreender a situação. Por mais que resolva o problema do entendimento, não apaga a falha técnica cometida em momentos simples, como uma conversa gravada em ambiente fechado, onde os envolvidos estão parados. Além disto, é inexplicável a participação de Cacá Diegues, produtor do longa-metragem, que surge em algumas sequências sem trazer qualquer contribuição relevante à proposta do filme.
Apesar de um início que satura devido ao didatismo com o qual o projeto das UPPs é explicado, aos poucos 5x Pacificação ganha força por perder justamente este lado de cartilha e partir para uma análise ampla sobre o processo de transformação que está em pleno andamento no Rio de Janeiro. Um filme interessante pela pluralidade dos entrevistados, fugindo do lugar comum e tentando provocar a reflexão do espectador.