Críticas AdoroCinema
4,0
Muito bom
Aliyah

Um judeu sem raízes

por Bruno Carmelo

Para a comunidade judaica, “aliyah” significa o retorno, a reunião de todos os judeus da diáspora de volta a Israel. Este pilar do pensamento sionista serve de ponto de partida para o drama dirigido pelo jovem cineasta Elie Wajeman. A questão, no entanto, não diz respeito à história da diáspora, ou à honra religiosa, e sim ao sentimento de pertencimento e de busca de raízes – algo que poderia ser, de certo modo, universal.

O personagem principal desta história, o francês Alex (Pio Marmaï), vem de uma família judaica tradicional, mas nunca teve grande apego às origens. Órfão de mãe, afastado do pai, sem esposa ou namorada, com poucos amigos e sem emprego, ele passeia por Paris em busca de pequenos bicos, ligados principalmente à venda de drogas. Quando descobre a possibilidade de retornar a Israel para trabalhar em um pequeno restaurante, aceita a oferta. A “aliyah”, no caso, torna-se irônica: Alex é um dos raros judeus a retornar por razões puramente financeiras, sem qualquer tipo de orgulho étnico ou vocação religiosa.

O desapego do personagem principal é brilhantemente ilustrado pelo diretor, que faz as escolhas mais expressivas para retratar a vida do protagonista. Com luzes naturais e uma steadycam seguindo cada passo do personagem, Wajeman constrói uma bem-vinda sensação de naturalidade, de despojamento que remete a alguns clássicos do cinema social francês, como A Vida Sonhada dos Anjos. Com o formato de tela bem retangular privilegiando os espaços e os enquadramentos destacando os rostos, a direção prefere o humanismo ao estetismo, observando todos os seus personagens sem julgamentos. Aliado ao ritmo ágil e às elipses bem dosadas, Aliyah é tecnicamente impecável, mostrando um domínio do espaço-tempo surpreendente para um diretor estreante.

O elenco contribui à impressão de brutalidade do filme. Pio Marmaï empresta a sua expressão vaga às indecisões de Alex e Cédric Kahn contrasta o olhar lacrimoso com os gestos violentos, enquanto as atrizes Adèle Haenel e Sarah Le Picard aproveitam os diálogos abruptos para criar um panorama de mulheres fortes e bem decididas. O filme apresenta personagens imprevisíveis, inconsequentes, mais focados na ação do que na reflexão. Ao evitar toda psicologia e delicadeza, o roteiro foge dos clichês do gênero (a redenção pelo amor, a descoberta da fé religiosa, a lamentação da dor histórica do povo judeu) para compor um mosaico socioeconômico potente das classes desfavorecidas e dos povos minoritários na Europa.

Talvez a conclusão de Aliyah perca um pouco de força ao revelar mais do que o necessário, trazendo otimismo para o retrato glacial feito até então. Mesmo assim, é nos pequenos símbolos (o curso de hebraico, o desenho contado no guardanapo de uma lanchonete) que a obra demonstra seu aspecto mais caloroso. Por fim, o drama serve para revelar um diretor seguro, capaz de manejar a complexa linguagem do cinema humanista e político. Embora o filme date de 2012, é ótimo ver sua estreia três anos depois nos cinemas brasileiros.