Críticas AdoroCinema
4,0
Muito bom
As Vantagens de Ser Invisível

Desajustes da juventude

por Lucas Salgado

Nos últimos tempos, a comédia dramática independente norte-americana passou a ser tratada quase como um gênero cinematográfico. Mais do que um produto fresco de baixo orçamento, passou a retratar clichê que poderiam ser considerados bonitinhos pelo publico sedento por personagens desajustados. Felizmente, As Vantagens de Ser Invisível é tudo, menos banal. Segue a fórmula indie atual, mas o faz sem largar mão de um roteiro inteligente, delicado, divertido e, muitas vezes, duro.

Charlie é um jovem solitário que já passou por traumas em sua vida. Ele convive com o suicídio recente de um amigo e as lembranças da morte da tia em um acidente. Começando o ensino médio, ele tem dificuldades em encontrar novos amigos, ainda mais que todas as panelinhas do colégio já estão formadas. Com o tempo acaba conhecendo Patrick e sua meia-irmã Sam, com quem passa a conviver diariamente. Ele descobre a felicidade, mas ainda sente falta de alguma coisa em sua vida.

Protagonista de Percy Jackson e o Ladrão de Raios, Logan Lerman interpreta Charlie e o faz com extrema delicadeza e dedicação. O ator passa muito bem a sensação de uma pessoa que está saindo de um momento delicado em sua vida e precisa lutar contra a depressão. Já Patrick é vivido pelo ótimo Ezra Miller, de Precisamos Falar Sobre o Kevin, que transforma o personagem em um sujeito sempre interessante, seja pela forma como é aberto com todos a sua volta, seja pelo fato de que internamente está sempre sofrendo com alguma situação.

Para completar o trio, Emma Watson surge radiante na pele de Sam. Ela está linda e cativante, mostrando o que muita gente já previa há alguns anos: se tornou uma ótima atriz. Ela possui uma naturalidade marcante, que faz o espectador se encantar imediatamente. Além disso, é impressionante o fato de que em pouco tempo de projeção já esquecemos que estamos diante da bruxinha Hermione. Quem tinha receio de que ela ficaria marcada por um papel, poderá ver aqui que isso não deve acontecer. Não quero dizer com isso que Harry Potter será um ponto esquecido em sua trajetória, mas sim que ela está mais para Harrison Ford do que para Mark Hamill se pensarmos em Guerra nas Estrelas.

Outros amigos desajustados aparecem pelo caminho, como a budista punk Mary Elizabeth (Mae Whitman, de Scott Pilgrim Contra o Mundo), mas o filme foca mesmo nos três citados acima. Em busca do amor, da felicidade e da aceitação, eles se unem em uma amizade verdadeira. Como estamos falando de adolescentes no colegial, é claro que eventuais romances podem acontecer, mas o que o longa transmite mesmo é a entrega de um amigo ao outro.

Repito que o foco da produção está em Lerman, Miller e Watson, mas é inegável que o ótimo grupo de coadjuvantes também ajuda bastante. Este é o caso de Paul Rudd, Kate Walsh, Dylan McDermott e da jovem Nina Dobrev, conhecida pela série The Vampire Diaries. Outro destaque é a presença enigmática de Melanie Lynskey, a Rose de Two and a Half Men.

The Perks of Being a Wallflower (no original) é dirigido por Stephen Chbosky, que também escreveu o roteiro e o livro que deu origem ao mesmo, além de atuar como produtor executivo. Ou seja, trata-se de um projeto extremamente pessoal e isso fica claro na condução sensível da narrativa.

Um dos principais méritos da produção está na direção de fotografia de Andrew Dunn. Ele opta por adotar uma cinematografia granulada, o que torna o filme diferente de todos os outros do gênero. É curioso que o mesmo profissional responsável pelos "quadrados" (em termos de fotografia) Amor a Toda Prova e Hitch - Conselheiro Amoroso. Outro elemento que deve encantar o espectador é a trilha sonora original de Michael Brook, que já havia feito um belo trabalho em Na Natureza Selvagem.

A seleção musical também é merecedora de aplausos, focando sua atenção em clássicos do rock alternativo dos anos 70 aos 90. New Order, L7, Cocteau Twins, Sonic Youth, The Smiths e David Bowie integram a mixtape criada pelo filme. É difícil não se emocionar com "Heroes", de Bowie, aparece em cena em dois importantes momentos.

As Vantagens de Ser Invisível conta com um desfecho duro e surpreendente, mas que em momento algum vai de encontra ao espírito dos personagens. Trata-se de um raro exemplo de produção estrelada por jovens que pode servir para todo tipo de espectador. Do adolescente ao mais idoso. Todos devem se identificar com os dramas vistos em cena.