Amizade inesperada
por Lucas SalgadoComo estamos quase do outro lado do mundo, nós, brasileiros, muitas vezes recebemos de forma passiva as informações vindas da disputa entre Israel e Palestina. Quando emitimos opinião, de forma geral, optamos por uma vilanização ou vitimização de quaisquer das partes. Por isso, é fascinante quando nos deparamos com uma obra que busca debater tal complicada vizinhança como ainda o faz através dos olhos de inocentes.
Uma Garrafa no Mar de Gaza conta a história de uma jovem judia de Jerusalém, crescida em Paris, que deseja entender porque sua cidade recebe ataques constantes que acabam com a vida de pessoas simples e inocentes como ela. Através do irmão, ela manda um recado em uma garafa que chega em Gaza, em que um jovem palestino recebe a carta e passa a se comunicar com a "vizinha" por e-mail.
Tal (Agathe Bonitzer) é a garota, enquanto que Naim (Mahmud Shalaby) é o garoto. Os dois se veem em uma troca de mensagens muito interessante. Inicialmente, ele assume uma postura agressiva ao ver que a menina não tinha muita noção do sofrimento de seu povo, quase justificando os ataques à Israel. Com o tempo, no entanto, ele vai sendo conquistado/convencido, ao mesmo tempo em que ela descobre um amigo e recebe diversas lições de vida.
É muito interessante ver a evolução da relação dos dois e a repercussão que tal contato causa em suas vidas pessoais. Não há um clima claramente romântico, mas a cumplicidade e a necessidade de falarem um com o outro, nos faz imaginá-los como uma espécie de novos Romeu e Julieta.
Dirigido por Thierry Binisti, que divide o roteiro com Valérie Zenatti, o longa tem como principal mérito o fato de não investir em clichês ou estereótipos. Conta histórias de dificuldade, mas não deixa de passar uma mensagem de esperança através dos atos individuais.
O elenco conta ainda com ótimas participações de Hiam Abbass, Jean-Philippe Écoffey, Loai Nofi e Abraham Belaga, que vivem personagens que também lutam para seguirem vivendo da melhor forma possível. A presença de bons coadjuvantes é significativa para mostrar que os dois protagonistas não são as únicas exceções. Tanto em Israel quanto na Palestina existem pessoas que sonham com o fim do conflito e com a convivência pacífica.
Une Bouteille à la Mer (no original) trata sim de esperança, mas não investe em doses exageradas de otimismo, uma vez que o medo continua imperando naquelas sociedades.