Críticas AdoroCinema
5,0
Obra-prima
Gravidade

Hostilidade a toda prova

por Francisco Russo

O universo é hostil. Sem oxigênio, sem som, no vácuo, ele não oferece a menor condição de sobrevivência à vida humana caso esteja fora deste planeta azul chamado Terra. As breves visitas do homem neste ambiente inóspito são sempre repletas de aparatos desenvolvidos para garantir sua existência, por mais que eles em muitos casos estejam longe do confortável. Foi exatamente com este cenário em mente, de desconforto e do risco constante, que o diretor Alfonso Cuarón conceituou Gravidade. Um filme que impressiona pela ousadia, tanto de narrativa quanto estética, sem jamais deixar de lado o clima de tensão.

A trama, em certo ponto, chega a ser simples. Três astronautas estão em pleno espaço, realizando consertos externos no telescópio Hubble, quando são surpreendidos por uma chuva de destroços decorrentes da destruição de outro satélite por um míssil russo. Um deles morre, os demais ficam soltos em órbita da Terra. Todo este breve preâmbulo é apresentado numa cena em plano sequência que dura cerca de 20 minutos – algo que não soa estranho para quem já viu Filhos da Esperança, do mesmo diretor, repleto de cenas neste estilo. Trata-se de uma abertura impressionante, não apenas pela beleza das imagens da Terra vista do espaço mas pelo próprio balé criado com a câmera para acompanhar os movimentos do carismático Matt Kowalski (George Clooney) e da angustiada Ryan Stone (Sandra Bullock) em meio à calmaria aparente que se torna um verdadeiro inferno no vácuo. E ele está só começando.

Por mais que o visual de Gravidade seja deslumbrante, com rotações de câmera muitas vezes usadas para ressaltar a sensação de pânico da personagem de Sandra, o que mais chama a atenção no filme é o domínio do diretor diante de tamanho desafio. É graças à excelência de efeitos visuais e sonoros que esta história pôde ser contada desta forma, com cerca de 90% das cenas em pleno universo. Entretanto, mais do que um mero exercício técnico, Alfonso Cuarón oferece também uma aula de narrativa a partir do ponto de vista da tensão. Há vários momentos em que o espectador fica extasiado com o exibido na telona, num misto de angústia e curiosidade sobre como tal cena foi realizada. Realmente impressionante.

Em meio a tantos aspectos técnicos, há ainda o belo trabalho dos atores. George Clooney é o alívio cômico, o astronauta experiente que foca no que deve ser feito também no aspecto emocional, enquanto que Sandra Bullock dá vida a uma personagem sofrida que tem uma revelação em meio ao caos. Ambos compõem seus personagens muito bem, trazendo humanidade a este cenário inóspito. Merece destaque também os breves simbolismos implementados por Cuarón no decorrer do filme, como a posição fetal que Sandra assume em determinada cena e o próprio desfecho da história, numa clara alusão à própria humanidade (e também um interessante contraponto com o início do clássico 2001 - Uma Odisséia no Espaço).

Por todos estes fatores, e outros tantos que não foram mencionados para não estragar o prazer que é acompanhar o desenvolvimento da história, Gravidade é um excelente filme que merece ser visto numa sala de cinema muito bem equipada em relação a som e imagem. O 3D ainda amplia a sensação de imersão neste universo vivido pelos astronautas, não apenas devido aos movimentos de câmera aplicados mas também pela própria vastidão causada pelo efeito de profundidade da tecnologia. Aposta forte para o Oscar 2014.