Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
O Ritual

Real até demais

por Roberto Cunha

Filmes baseados ou inspirados em fatos reais possuem a característica de serem levados a sério por uns e totalmente desacreditados por outros. Uma das prováveis razões do preconceito foi a enxurrada de produções do gênero no auge do video cassete (o famigerado VHS), quando muitos títulos iam direto para a televisão e locadoras. O Ritual foi inspirado no livro de um jornalista que conviveu durante um período com padres exorcistas de verdade.

O início tem um tom sombrio e conta com a presença de um ator velho conhecido do pessoal do VHS: Rutger Hauer. Na cena em questão, ele e o pequeno Michael estão numa funerária preparando um morto antes de seu enterro. Logo em seguida, é possível ver Michael Kovak (Colin O'Donoghue) já maior e decidido a não seguir a carreira do pai. Vivendo como seminarista, seu maior fantasma é a constante ausência de fé e a vontade de abandonar tudo. Diante do conflito do apóstolo, seu superior o envia ao Vaticano para realizar estudos sobre a prática de exorcismos e onde seu conhecimento de psicologia poderá ser útil. Após aulas sobre sinais de possessão e outros detalhes sinistros, ele ainda se mantém cético. Para sacramentar de vez a situação, o Padre Xavier (o ótimo Ciarán Hinds) sugere uma visita ao jesuíta Lucas (Anthony Hopkins), considerado "o papa" dos exorcismos". É quando Kovak, finalmente, entra em contato com o lado mais obscuro da igreja, objeto de investigação da jornalista Angeline (Alice Braga).

Tendo como espinha dorsal o questionamento religioso, moral e familiar do protagonista, os diálogos não chegam a ser pérolas, mas têm lá seu brilho para envolver o espectador naquela aura de mistério. E conseguem ser provocativos em vários momentos com frases do tipo "Não acreditar não significa que está protegido". Entre as cenas de ação, a maioria delas protagonizada por uma grávida possuída, uma em especial é violentamente assustadora e envolve uma criança, mas o melhor é que você não vê. Só imagina. No elenco, para a tranquilidade do fãs, Sir Hopkins convence como Lucas, mesmo que possuindo fortes traços de Hannibal Lecter de O Silêncio dos Inocentes. Quem gosta de observar detalhes, a câmera picada mostrando a vítima do atropelamento na posição de Jesus Cristo na cruz é até clichê, mas ainda bem bacana. Por outro lado, vai ficar aterrorizado com o merchandising de uma lanchonete mundialmente famosa.

Com uma clara intenção de trazer o tema antigo - e clássico - para a atualidade, ainda é possível encontrar sustos para quem os espera. Mas quem procura cabeças girando ou vômitos, o roteiro comete um pecado e tanto ao "curtir" com o clássico O Exorcista. Dirigido pelo sueco Mikael Håfström (1408), que parece ter uma quedinha pelo gênero, o resultado só não foi melhor porque não conseguiu exorcizar certos cacoetes, como a inserção de humor. Um exemplo gritante é um telefone celular atrapalhar um exorcismo. É quando o real quebra o clima e o próprio ritual.