Críticas AdoroCinema
4,5
Ótimo
O Mestre

Gênios e monstros

por Bruno Carmelo

É curiosa a reação que O Mestre tem despertado na mídia. Nas suas primeiras apresentações, foram unânimes os gritos de "gênio", "obra-prima", "um dos melhores filmes de todos os tempos". Depois a euforia decantou, e começaram a surgir, aqui e ali, algumas vozes sugerindo que faltava algo ao filme. Ninguém sabia dizer muito bem o quê – talvez uma posição do diretor sobre o tema, ou então cenas mais impactantes. Surgiu um clima de fim de festa, de desilusão.

Essa reação pode ser compreendida de diversas maneiras. Primeiro, porque O Mestre é de fato misterioso, silencioso. Ele é simples em sua história, mas complexo em sua estrutura; ele é respeitoso na construção dos personagens, embora eles sejam todos moralmente condenáveis. Paul Thomas Anderson empresta um olhar racional a uma história de paixões (a situação pós-guerra, o nascimento dos cultos religiosos), preparando o espectador para um grito que nunca vem. Este é um filme belíssimo em sua aparência, e monstruoso em sua essência.

O roteiro, de uma inteligência notável, evita qualquer julgamento, qualquer diálogo explícito. A compulsão sexual e alcoólica do ex-marinheiro Freddie Quell (Joaquin Phoenix) é mostrada de maneira sutil, orgânica. Quando nós somos apresentados à trama, o culto A Causa já existe, o alcoolismo de Freddie também, e os Estados Unidos já estão em uma melancólica depressão pós-guerra. Esta pode ser uma segunda fonte de desconforto: nada é escondido para criar suspense, ou explicitado para facilitar a compreensão. O filme não parece ter sido feito para o prazer do espectador, pelo contrário, ele existe apesar do público.

O trio de atores é excelente. Todos constroem personagens de uma incrível complexidade, como raramente vê no cinema recente. Joaquin Phoenix compõe um homem perdido e violento, símbolo do "animal" compulsivo e irracional que A Causa tanto rejeita, Philip Seymour Hoffman faz o mestre discretamente carismático e sutilmente persuasivo, Amy Adams interpreta a figura materna tão carinhosa quanto opressiva, sempre com um olhar enlouquecido no rosto. Os três estão assustadores, em todos os sentidos. Eles dependem uns dos outros, se consumem e se entrelaçam de maneira obsessiva. É engraçado como, mais do que drama, O Mestre parece mesmo um filme de horror.

Paul Thomas Anderson compõe algumas das imagens mais belas da sua filmografia, e também do cinema recente. Ao invés das belezas fáceis de paisagens (beleza de protetor de tela de computador, estilo A Árvore da Vida), ele cria momentos magníficos em uma loja de departamentos, dentro de uma sala de revelação de fotografias ou ainda no interior de uma garagem com equipamentos navais. A beleza deste filme não é fácil, ela não se encontra pronta na natureza. Ela foi cuidadosamente construída pelos enquadramentos fluidos, pela trilha hipnotizante (nada de um John Williams catártico), pela fotografia discreta. Cada elemento técnico é perfeitamente orquestrado, sem chamar atenção para sua própria grandiosidade. Eis um terceiro elemento de desconforto: ver uma obra longa, grande e majestosa comportar-se como um filme discreto, que desconhece suas próprias qualidades. É o velho problema da modéstia percebida como arrogância.

Mas Anderson tem de fato um domínio incrível da imagem. Sua cena de uma festa noturna, com os participantes nus, é digna das melhores passagens surrealistas de Luis Buñuel, a apresentação do navio de Lancaster passando sob uma ponte é tão bela quanto as melhores cenas de O Atalante de Jean Vigo, a abertura com as ondas e o plano da embarcação em plongée lembra o melhor de Stanley Kubrick.

Tenho a impressão de que O Mestre será uma daquelas obras-primas estudadas por alunos de cinema, de artes e de filosofia, daqui a vinte ou trinta anos. Um filme que pode ser adorado pela próxima geração de cinéfilos, destrinchado pelos futuros teóricos, e retomado muitos anos mais tarde, quando alguém vai lamentar que um filme tão grandioso, tão complexo, tão perturbador, não tenha sido recompensado com nenhum grande prêmio "de arte" (nada de Leão de Ouro em Veneza), nem de público (nada de Oscar de melhor filme). Uma destas grandes obras injustiçadas em sua época.