Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Tony Manero

NOS EMBALOS DE UMA LOUCURA CONTÍNUA

por Roberto Cunha

Tony Manero, do chileno Pablo Larrain, é um sucesso de crítica e já conquistou uma série de prêmios quando exibido em festivais mundo afora. Contudo, isso não é sinônimo de sucesso garantido junto ao público. Primeiro porque a opção por uma linguagem dita "modernosa" (câmeras tremendo, perda de foco e edição com cortes bruscos) não agrada muita gente. E depois porque o protagonista é baseado em outro personagem marcante, mas datado: o Tony Manero de John Travolta em Os Embalos de Sábado à Noite. Outro ponto importante que deve ser levado em consideração é o fato de a história se passar em plena ditadura do general Pinochet, no Chile dos anos 70/80. Mas são meras suposições. De concreto, o longa é estranho. Surpreendente pela levada crua, mas cansativo com a falta de ritmo.

A história começa com Raul (Alfredo Castro) na fila de um programa de TV onde pretende imitar Travolta. De cara, a opção do roteiro é mostrar um traço estranho com ele tendo dificuldades de se comunicar com a produtora do show, mas armando um esquema para se dar bem na fila perante os outros candidatos. Na sequência seguinte, tal comportamento duvidoso se escancara quando, ao entrar no cinema, rouba um monte de balas e fica na sala - sozinho - repetindo os diálogos de Tony Manero. E detalhe: ao lado do indefectível conjunto blazer e calça brancos.

Essa forte ligação dele com o personagem do filme é inquietante. Até porque ele é capaz de se emocionar com as músicas de sua pátria, mas sempre dançando como Travolta. Vítima de um momento opressor em seu país, Raul se esgueira pelas ruas, paralisa quando ouve uma sirene ou um assobio. Sem trabalho fixo e somente a ideia fixa de imitar seu ídolo, ele lidera um grupo de dança amador, formado pela esposa, filha e o namorado dela, que juntos coabitam numa espécie de hospedagem com palco para apresentações. Disposto a fazer um show com sua trupe e competir no famoso programa de tv, o fã não mede esforços para realizar seus sonhos como, por exemplo, ter uma pista com chão iluminado igual ao filme. E para isso, roubar ou matar passa a ser um mero detalhe em sua escalada para o sucesso.

Sem refletir sobre o seu tempo, o regime ou a sociedade, não quer saber de igualdade porque se percebe diferente. Sua vida é norteada pela obsessão de ser Tony Manero. Só tem olhos e corpo para isso, sendo capaz de cometer crimes insanos, camuflados na opção do diretor de apenas mostrar a intenção ou os gestos, mas nunca as conseqüências de tais atos. O resultado, mesmo assim, é forte e deixa claro para o espectador o grau de loucura do protagonista. Algumas cenas são de uma crueldade ímpar. Destaque para a pureza de uma senhora, salientando o brilho dos olhos azuis de Pinochet numa rara TV a cores em contraste com a mente transtornada de Raul. Tony Manero não deixa dúvidas. É programa para poucos, apesar de tanto sucesso.