Críticas AdoroCinema
5,0
Obra-prima
Inimigos Públicos

MIRA CERTA NO ENTRETENIMENTO

por Roberto Cunha

Inimigos Públicos é uma quase uma ode ao criminoso John Dillinger, famoso por seus inúmeros crimes e fugas. Situando o espectador no tempo (1933) e no espaço (época de ouro dos assaltos a bancos), a ação não demora a começar. E como os tempos são outros, tudo é menos pirotécnico. Sem efeitos especiais mirabolantes, os estampidos das armas são muito mais próximos da realidade, permitindo que se note a diferença - e a sutileza - no som dos tiros das clássicas metralhadoras Thompson e Tommygun (pente giratório), e dos rifles de grosso calibre. A produção tem imagens bem realistas, boa reconstituição de época sem exageros, com carros, ruas, roupas, e até cinema com participação especial e direito a exibição de Vencido pela Lei, onde se vê uma identificação de Dillinger com o personagem de Clark Gable. E revela mais da história do ousado assaltante - e frio assassino - que conquistou a mídia e os americanos por ter entre suas regras roubar apenas o dinheiro das instituições financeiras e nunca o cidadão.

Dillinger (Johnny Depp) era um "cara durão", misto de gentleman com brucutu, que transitava com facilidade entre a cordialidade e a rudez, e que deixava claro sua filosofia quando pergunta para um bancário se ele prefere ser um covarde vivo ou um herói morto. A alcunha de inimigo público nº1 só serviu para aumentar sua fama. Na medida em que ela crescia, J. Edgar Hoover (Billy Cudrup) plantava a semente daquela que se tornaria uma das instituições mais famosas do mundo: o FBI. Entretanto, você conhecerá um bureau no começo de suas atividades, enfrentando dificuldades políticas e financeiras, com agentes experientes como Melvin Purvis (Christian Bale) e burocratas, enfrentando bandidos com armas e veículos melhores, remetendo, inclusive, para a realidade dos policiais brasileiros em pleno século XXI.

Como um típico filme de personagens machões, Inimigos Públicos traça um paralelo entre a ousadia de um bandido que afirma ter aprendido tudo nas prisões e a determinação do agente da lei que insiste no uso da inteligência para capturá-lo. O longa destaca como já naquela época, a mídia construía os mitos, e como a arrogância de Dillinger ("somos melhores e mais rápidos do que eles") o fez quebrar a principal de suas regras de não trabalhar com desesperados ("no desespero, não há escolha"), o que se transformou em seu maior algoz.

Baseado no livro de Bryan Burrough, Inimigos Públicos não tem a pretensão de ser uma obra prima, já que diverte, toma várias licenças e comete deslizes, mas nada que comprometa. Por exemplo: em uma cena, durante uma sessão de cinema, a foto de Dillinger é divulgada, convocando as pessoas para que olhem para os lados e o denunciem. E ele estava na sala?! Em outro momento, numa rua cheia de policiais ele não é reconhecido mesmo com uma arma na mão. O próprio romance vivido por Dillinger e Billie Frechette (Marion Cotillard) não tem o peso necessário para envolver o espectador, mas, curiosamente, uma das cenas mais bonitas é a de Purvis carregando-a no colo após um violento interrogatório.

A boa trilha sonora mescla um bom blues rock nas cenas de ação e a triste "Bye Bye Blackbird" em off de Billie Holliday, na voz de Diana Krall, em cena, reproduzindo um dos clássicos da música americana outrora cantada por artistas como Frank Sinatra e Liza Minelli, entre outros. Destaque curioso para o merchandising da Zenith no rádio de época e para a inexorável citação do Brasil, mais especificamente o Rio de Janeiro, como opção de fuga da justiça. Não perca a explicação - por escrito - do destino dos personagens após as últimas imagens do filme. A impressão nítida que se tem é que o diretor Michael Mann, de filmes com O Informante e Colateral, mirou mesmo no entretenimento de qualidade. E conseguiu. Se você está no time dos que gostam de filmes sobre máfia, gângster dos anos 30, prepare a munição. E se ainda por cima curte o trabalho de Depp, o tiro é certeiro e o programa está garantido.