O início de uma amizade
por Lucas SalgadoNuma história de quase 30 anos, a Pixar realizou obras primorosas como Toy Story - Um Mundo de Aventuras, Procurando Nemo, Ratatouille e muitos outros, que firmaram a companhia dentre as empresas mais criativas e queridas da sétima arte. Aos poucos, começou a inserir sequências em sua linha de produção e daí nasceram Toy Story 2, Toy Story 3, Carros 2 e, agora, Universidade Monstros. Para a felicidade dos cinéfilos, o investimento em continuações não representou uma queda de qualidade nos filmes da Pixar, embora seja inegável que Carros 2 seja o pior longa da empresa.
O principal mérito neste novo caminho está no fato de nunca investirem na mesmo história. Se fora do mundo mágico da Pixar vemos sequências idênticas aos originais em casos como Se Beber, Não Case! e Se Beber, Não Case! Parte II ou em franquias como American Pie e Todo Mundo em Pânico, nas animações da empresa vemos que o objetivo é sempre o novo. Universidade Monstros, por exemplo, é completamente diferente do original Monstros S.A.. E o que está em questão não é apenas a linha temporal, os filmes não são diferentes apenas por retratar momentos diferentes nas vidas dos personagens. São diferentes porque assim foram escritos pelo trio Dan Scanlon, Robert L. Baird e Daniel Gerson (novo) e pelo quarteto Pete Docter, Andrew Stanton, Jill Culton e Ralph Eggleston (anterior).
Monstros S.A. focava sua atenção no novo, representado na figura da fofa Boo. Os protagonistas James Sullivan e Mike Wazowski eram obrigados a enfrentar todo um mundo desconhecido, vindo do lado dos humanos. Agora, em Universidade Monstros, o que vem de fora pouco importa. Eles são obrigados a confrontar seus sentimentos internos. Mike é detentor de uma força de vontade e de um sonho que lha dá força, embora passe a imagem de iludido para o resto do mundo. Já Sulley surge como o sujeito perseguido pela sombra de seu famoso pai ao mesmo tempo em que passa a imagem de um sujeito convencido e muito seguro de si.
Já em sua primeira cena, o filme se mostra disposto a tudo para cativar o cinéfilo, trazendo um Mike Wazowski pequenininho e meio solitário que de cara faz todos no cinema falarem "ownnn". É mais fofo que a própria Boo e faz com que o longa ganhe o coração do espectador já no início da obra. Mike surge em uma excursão da escola à sede da Monstros S.A., empresa especializada em sustos à crianças humanas, até então conhecido como principal gerador de entergia para o mundo dos monstros.
Mike decide já naquela visita que vai ser um assustador profissional e resolve estudar para isso. Após uma passagem de tempo (inserida de forma divertida nos créditos iniciais), o jovem se vê entrando para a universidade para frequentar uma escola de sustos. Ele se depara com um belo câmpus, com disciplinas eletivas, nerds, hippies, garotos e garotas populares. Ou seja, tudo o que já nos acostumamos a ver numa centena de filmes passados em universidades. Lá, conhece Jimmy Sulley, um sujeito popular e arrogante que o vê como um tampinha que não tem futuro no mundo dos sustos. Após uma série de eventos, os dois se veem obrigados a competir juntos em uma olimpíada que pode mudar para sempre a vida letiva dos dois.
A qualidade da animação segue o padrão Pixar. Os personagens, os cenários, tudo é extremamente bem desenhado. Mas não se trata apenas de se desenhar bem um personagem ou objeto. Trata-se, principalmente, de animar todo um mundo que soa verdadeiro e acolhedor ao espectador.
Monsters University (no original) apresenta alguns clichês de filmes com disputas esportivas e ainda conta com referências à obras que destacam o universo estudantil, como Carrie, A Estranha. Mas, por outro lado, diverte (e muito) em algumas situações. A equipe formada por Mike, Sulley e um grupo de exóticos monstros é bem curiosa, assim como algumas das provas que precisam enfrentar.
O público assiste de sua poltrona ao nascimento da amizade entre os dois protagonistas, mais uma vez dublados por Billy Crystal e John Goodman. É interessante notar que nem tudo são flores na história da dupla. Eles começam quase como inimigos, veem a convivência melhorar, mas ainda sim quase colocam tudo a perder por causa de orgulho e de uma mentira.
Lembrando o trabalho de Tim Burton em A Noiva-Cadáver, o diretor e roteirista Dan Scanlon faz a divertida opção de retratar o mundo humano como um lugar sombrio, enquanto que o dos monstros (e dos mortos no filme citado) é repleto de cor e alegria. Neste sentido, é difícil não ficar impactado com a cena em que vemos Mike e Sulley como únicos pontos coloridos (ainda que pouco coloridos) em uma noite chuvosa diante de um lago cinzento. A sequência é lindíssima e diz muito sobre o sentimento dos personagens.
O filme obviamente se aproveita do carinho que já sentimos pelos personagens, que vem lá de Monstros S.A., mas é importante destacar que não fica se esforçando para criar referências ao outro. Vemos outros personagens e até entendemos a "criação" do vilão Randy, mas nada que fuja da trama da nova produção.
É importante destacar que há uma cena bem divertida após os créditos, então nada de sair da sala de cinema antes da hora. Os próprios créditos finais são divertidos, repetindo a ideia do início e investindo numa passagem de tempo que leva os personagens principais ao ponto de partida da obra anterior.