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    Festival de Cannes 2015: A delicadeza de Naomi Kawase e o horror da Segunda Guerra Mundial

    AN e Saul Fia foram os destaques do dia.

    Dia de extremos no Festival de Cannes. Após um início avassalador com a exibição do vibrante Mad Max: Estrada da Fúria, chegou a vez de dois filmes bem antagônicos.

    O primeiro deles foi o simpático AN, da diretora japonesa Naomi Kawase (que concorreu à Palma de Ouro no ano passado, por O Segredo das Águas). Filme de abertura da mostra Un Certain Regard, a segunda mais importante do festival, o longa-metragem acompanha o relacionamento entre um vendedor de dorayaki (um doce tipico japonês) e uma senhora de 76 anos, que tenta a vaga de ajudante na pequena lanchonete. A resistência inicial cai por terra quando ela lhe entrega um pouco da pasta utilizada no recheio do doce, o tal AN do título, bem mais saborosa que a utilizada até então.

    Por mais que a trama inicial seja batida - vários são os filmes já feitos onde a comida é o meio para mudar a vida das pessoas -, AN cativa pelo modo suave conduzido pela diretora e pela atuação de Kirin Kiki, a velhinha da história. Repleto de belas paisagens com as emblemáticas cerejeiras, o longa-metragem traz uma certa crítica implícita ao mercantilismo existente na comercialização em larga escala de alimentos e aborda, de forma oportuna, a questão do preconceito no Japão.

    Bem mais acessível ao grande público do que O Segredo das Águas, AN pode ser classificado como um feel good movie. Algo bem diferente de Saul Fia, exibido na tarde de hoje.

    Selecionado para a mostra competitiva, o longa-metragem é também a estreia do diretor húngaro Laszlo Nemes no formato. A história acompanha um homem judeu que, em pleno campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, trabalha (forçado) como sonderkommando - os judeus separados dos demais para carregar os corpos dos prisioneiros e ainda cremá-los, após passarem pelas câmaras de gás. Ou seja, não há o menor espaço para qualquer tipo de amenidade.

    Com uma proposta estética bem rigorosa, onde a câmera ou está focada no rosto do Saul do título ou apresenta o que ele vê, o longa acompanha os horrores da guerra sob o olhar de quem a vivencia, dia após dia. O semblante sempre empedernido é algo inevitável para suportar a tragédia diária e o fato de, apesar de obrigado, participar de alguma forma da matança generalizada.

    Diante de tal proposta, Saul Fia oferece um considerável desafio a Géza Röhrig, intérprete do personagem principal, já que ele está praticamente em todas as cenas. A tensão do local é transmitida muito pelo que acontece à sua volta e o próprio desespero transmitido, contido em sua ausência de liberdade, quando precisa encontrar algum meio de recolher o corpo do próprio filho e enterrá-lo. Um desempenho que o coloca entre os possíveis candidatos ao prêmio de melhor ator deste ano - mas, é sempre bom relembrar, 17 filmes da mostra competitiva ainda serão exibidos. Ou seja, ainda há muito para acontecer (e especular) em relação aos possíveis premiados deste ano.

    Amanhã é dia de conferir mais dois candidatos à Palma de Ouro: The Lobster, de Yorgos Lanthimos, e The Sea of Trees, de Gus Van Sant. Nossa opinião sobre ambos você poderá conferir aqui mesmo, no AdoroCinema.

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