Espetáculo Visual
por Francisco RussoOs profetas do apocalipse volta e meia anunciam o fim do cinema, sempre que uma nova tecnologia ganha força. Foi assim com o videocassete, com o DVD, com o download e agora o Blu-Ray. Esquecem que cinema não é apenas assistir a um filme, mas todo o ritual e a magia em torno do programa. Mais ainda: a existência de condições ideais para que o espectador se desligue de tudo o que há ao redor, atendo seu foco ao que acontece na telona. Por mais polegadas que tenha a televisão e melhor seja o sistema de áudio, não há como repetir, precisamente, esta sensação. Filmes como Avatar lembram o quão importante é esta adequação.
Trata-se de um grande espetáculo, que merece ser visto na sala de melhor qualidade disponível. Se possível, em versão 3D e com legendas. A ambientação do filme conta com duas grandes qualidades: beleza e criatividade, caminhando de mãos dadas. A profusão de animais e vegetais de Pandora impressiona, com espécimes ricos em detalhes inesperados. A beleza surge na quantidade e diversidade de cores, brilhos, efeitos e, em especial, na sensação de profundidade provocada pelo 3D. Houve até mesmo a preocupação para que a inserção das legendas não atrapalhasse esta sensação, já que elas são, em várias cenas, posicionadas de forma a não sobrepor o que está em maior destaque naquele momento. O resultado é um efeito de encantamento, de estar diante de um espetáculo visual poucas vezes visto até então.
Entretanto, Avatar traz mais. A história, se não é propriamente original, apresenta bem o habitat em questão. Tudo se passa em Pandora, onde vivem os nativos Na'Vi. Há três conflitos decorrentes da presença do ser humano no local, todos bem delineados: o científico, o militar e o econômico. O primeiro, representado pela Grace Augustine de Sigourney Weaver, deseja entender este novo espécime e sua sociedade. O militar, obviamente, deseja conquistar tudo de forma a ampliar seu domínio. E o econômico deseja explorar Pandora ao máximo, visando gerar muitos lucros sem se importar com as consequências. Mais ou menos como é feito na própria Terra há alguns séculos, cujo resultado é percebido no número cada vez maior de extinções e na temperatura cada vez mais alta.
De início estes três lados trabalham juntos e, é claro, irão se enfrentar. É aqui que a cultura dos Na'Vi ganha força. A partir do momento em que Jake Sully, interpretado por Sam Worthington, passa a ser iniciado na sociedade local é revelada a riqueza ali existente. Há uma ligação profunda entre os Na'Vi e Pandora, no sentido físico, espiritual e também de respeito. Eles acreditam na força da natureza e oram para ela. Eles matam animais, mas buscam agir com o menor sofrimento possível, a chamada "morte limpa". Eles se conectam com animais e vegetais, através de sinapses que fazem com que cada Na'Vi entre em uma grande rede com o planeta. São pequenos detalhes que formam uma nova civilização, apresentada ao espectador usando as já citadas beleza e criatividade.
É verdade que várias destas ideias não são propriamente novas. A migração do ser humano para seu avatar já foi visto em Matrix, sob outro formato. A relação dos nativos com o planeta de certa forma lembra Final Fantasy, desta vez envolvendo Gaia. O desenrolar do roteiro não surpreende e lembra diversas aventuras cujo protagonista entra em um novo grupo com um objetivo e, após conhecê-lo melhor, muda de lado. Tudo isto pouco importa neste caso. Avatar é original em seu formato e nos detalhes, na criação de uma sociedade com cultura própria. E, especialmente, em uma nova forma de fazer cinema.
O lado técnico merece destaque pela inserção do 3D na história de forma natural, ao invés da criação proposital de cenas em que se brinca com a possibilidade de algo saltar da tela para perto do olhar do espectador. Também chama a atenção o perfeito entrosamento entre atores reais e os personagens criados em computador. Não há qualquer sensação de artificialidade. O Oscar de efeitos especiais deste ano já tem dono.
Por todos estes motivos, Avatar merece ser visto. É uma experiência de cinema, que traz um filme repleto de aventura, com bom ritmo e um visual deslumbrante. James Cameron, assim como fez com Titanic, pegou uma história de certa forma simples e a cercou de um apuro técnico e visual impressionante. Deixa a vontade de conhecer mais sobre este estranho e belo planeta.