Um herói sentimental
por Bruno CarmeloO início deste filme surpreende ao reproduzir os minutos finais de Rocky, um Lutador (1976). Não se trata de uma menção aos fatos do filme anterior, algo frequente em sequências, mas a exata cena do outro filme. A repetição possui a função de insistir na temporalidade - a ação continua segundos após a luta entre Rocky e Creed - além de forjar uma espécie de segunda metade da mesma história.
No entanto, existe uma grande diferença entre os dois filmes. Com a saída do diretor John G. Avildsen, Sylvester Stallone assumiu o cargo, mantendo-se igualmente na função de roteirista. As transformações são visíveis tanto no estilo quanto no roteiro. No que diz respeito ao estilo, Stallone trouxe um sentimentalismo muito diferente da frieza e da melancolia do primeiro Rocky. Desta vez, as imagens estão repletas de trilha sonora triste, câmeras lentas, close-ups no rosto dos atores nas cenas catárticas e vários outros efeitos durante a luta.
Por um lado, A Revanche ganha em realismo e no caráter espetacular: a luta simples e meio falsa da produção original torna-se visceral, com efeitos sonoros e de montagem destinados a imergir o público na produção e torcer ainda mais por Rocky. Por outro lado, perde-se a simplicidade que constituía um dos grandes atrativos da obra original. A sequência adota uma linguagem mais convencional, disposta a agradar e apelar às sensações ao invés da razão.
Estes elementos se percebem no roteiro, preocupado em atribuir um caráter melodramático à revanche. Entram em cena o casamento de Rocky com Adrian (Talia Shire), o perigo de Rocky perder a vista caso lute novamente, a sensação de fracasso ao não se inserir no mercado de trabalho, o problema de saúde que afeta a esposa grávida. O roteiro desta produção é um tanto novelesco: acredita-se que é preciso multiplicar os conflitos para ampliar o potencial emotivo da história, logo após uma experiência tão bem-sucedida em minimalismo narrativo três anos antes.
Por isso, o roteiro faz algo improvável: transforma Rocky em um azarão ainda maior do que no primeiro combate. Desta vez, o boxeador dispõe de menos tempo para se preparar e lida com uma dor pessoal, enquanto Apollo treina com mais empenho do que antes. A vitória torna-se improvável. A ingenuidade de Rocky também é maior, assim como a arrogância de Apollo. De certo modo, A Revanche pretende oferecer um pouco mais do mesmo - um novo combate entre a dupla de boxeadores - com elementos aprofundados e reiterados.
Apesar de perder em ambientação, por explorar pouco a cidade de Filadélfia e a cultura popular, Stallone faz um trabalho competente no que diz respeito à solidão do protagonista. O diretor, que comandou quatro filmes da franquia, nunca se mostrou muito à vontade filmando espaços, mas sempre possuiu um domínio excelente da construção de seu personagem principal. A atuação de Stallone é ótima mais uma vez, imprimindo tristeza e amargura em cada diálogo. Rocky é menos um azarão por sua trajetória atípica no esporte do que por sua incapacidade de se inserir na sociedade, em uma família ou grupo de amigos.
Neste sentido, a sequência, destinada a oferecer a conclusão que o espectador pensava encontrar no original, funciona como bom estudo de personagens. Esta acabou sendo a marca de Stallone como diretor na franquia Rocky: uma mão pesada para o drama, mas um carinho comovente por personagens como Adrian, Paulie, Mickey e o próprio Rocky.