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    Alma Imoral
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Alma Imoral

    A desobediência transforma

    por Sarah Lyra

    Em Alma Imoral, o diretor Silvio Tendler propõe uma investigação acerca do complexo embate entre matéria física e transcendentalidade. Logo em sua cena inicial, Tendler deixa a proposta clara para o espectador e age de modo a guiá-lo por uma experiência pautada no abstrato e na subjetividade. Para escancarar sua mensagem principal, de que o avanço da humanidade está intimamente conectado a atos de desobediência, o documentário nos apresenta a um painel de entrevistados cujas histórias de superação foram marcos transgressores da vida em sociedade, uma vez que suas ações foram precursoras na quebra de padrões comportamentais.

    Embora pareçam desconexos em um primeiro momento, as transgressões abordadas — fortemente ligadas a religião, orientação sexual, conflitos armados, contradições políticas, arte e ciência — passam a fazer sentido à medida que o documentário avança em sua narrativa. O filme funciona quase como uma série de reportagens independentes, mas que ao mesmo tempo formam um todo coeso quando alinhadas em uma única mídia, principalmente porque a montagem prioriza a conexão com os entrevistados — por parte do espectador e do próprio entrevistador, o rabino Nilton Bonder, autor do livro homônimo no qual o documentário se baseia. Abre-se mão, portanto, do recorte de falas intercaladas tradicional do gênero. Uma vez que um novo personagem é apresentado, Tendler permite que sua fala seja ouvida sem interrupções, oferecendo o tempo necessário para que um discurso seja articulado.

    Em termos de linguagem, Tendler adota como fio condutor coreografias de um grupo de dança em preto e branco, embaladas por uma narração em off com citações sobre corpo, alma, religiosidade, entre outros. O conjunto, no entanto, é por vezes confuso, principalmente na estética, que ora se mostra rudimentar, ora pretende uma plasticidade sofisticada. As imagens, embora evocativas com seus brancos estourados e texturas semelhantes a riscos de giz, pouco dialogam com o aspecto despojado das entrevistas, principalmente porque parece haver um desapego da produção em relação à técnica — como no fato de diversas entrevistas estarem com o foco da lente voltado para o fundo do cenário, e não para o entrevistado.

    Portanto, não é possível determinar se a informalidade empregada é no sentido de priorizar a retórica, ou um descuido por parte dos realizadores. Os trechos performáticos, além serem excessivos, perdem impacto na segunda metade do filme, pois ao usar as danças como uma tradução visual do texto narrado, acabam não deixando espaço para a imaginação do espectador, por mais poética que se proponha a ser. Ainda assim, Alma Imoral consegue se manifestar com clareza a partir da eloquência do painel de convidados, cujas histórias são o ponto alto do documentário, e vê em Tendler — e Bonder, que lidera com confiança as interações em frente à câmera — uma espécie de compilador de contos com uma temática em comum.

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