Em cima do muro da tensão
por Renato HermsdorffDirigido pelo ator John Krasinski, Um Lugar Silencioso é um terror promissor, que, no entanto, não se decide se pende para a prateleira das produções "de arte" ou se embarca logo em um viés mais comercial. (Mais) Conhecido no universo da comédia, o realizador - que faz o papel de Jim Halpert na versão americana da aclamada The Office -, faz uma aposta ousada ao embarcar no filme de gênero, o que é uma escolha louvável, com um bom elenco capitaneado pela esposa Emily Blunt (Sicario: Terra de Ninguém), mas que parece não confiar muito na própria "mitologia".
A Quiet Place (no original) se passa num futuro pós-apocalíptico não muito distante, onde a Terra foi invadida por extraterrestres. Pouco se sabe sobre os invasores, apenas que são cegos e que, ao captar qualquer barulho a partir de um certo nível de ruído, atacam a fonte sonora de forma implacável.
É nesse ambiente suspenso de pura tensão no meio de um milharal - um segundo elemento que evoca Sinais, de M. Night Shyamalan -, que vive a família composta por pai (Krasinski), mãe (Blunt), filho (o menino Noah Jupe, de Extraordinário) e filha (a atriz Millicent Simmonds, deficiente auditiva, que trabalhou com Todd Haynes em Sem Fôlego). Culpa, aceitação e uma gravidez no meio do caminho são alguns dos ingredientes que contribuem para tornar a experiência desta família (e a do espectador) ainda mais aflitiva. Treinando as crianças para sobreviver por conta própria neste contexto, o filme funciona como uma metáfora sobre as responsabilidades (e medos) que rondam a paternidade.
A (boa) premissa é de autoria de dois jovens roteiristas (Bryan Woods e Scott Beck), que assinam o texto final com Krasinski. E não deixa de ser um desafio, afinal, Krasinski e cia. não podem contar aqui (pelo menos, não plenamente) com o apoio do diálogo. Sobretudo nos dois terços iniciais, trata-se quase de um filme mudo. Aí, há dois caminhos a serem explorados na construção de clima: o do som e o da trilha. Quando investe no primeiro recurso (som), o resultado é envolvente.
Seja pela água corrente de um rio, o bater de um coração no estetoscópio, a canção que brota de um fone de ouvido (esse momento é lindo), Um Lugar Silencioso transita entre a apreensão e a emoção de forma genuína. Quando usa a trilha sonora como muleta, o resultado é forçoso, apelativo.
Regras na mesa (de como os ET´s operam), a trama se desenrola de forma a contradizer a própria literatura apresentada ao espectador. Depois de um certo tempo, é possível divagar fazendo perguntas do tipo "mas por que ela não...?", "Como ele não...?", "É possível que...?" Uma parte quer acreditar que se tratam de "licenças poéticas"; como são algumas, no plural, no entanto, levam a concluir que são furos no roteiro mesmo.
Ainda assim, de uma forma geral, o clima angustiante permeia a obra até o fim. Um final, aliás, que é um nocaute.
Filme visto no festival South by Southwest (SXSW), em março de 2018.