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    Sin Norte
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Sin Norte

    Viagens paralelas

    por Bruno Carmelo

    Estéban (Koke Santa Ana) e Isabel (Geraldine Neary) formam um casal que acaba de atravessar um trauma. Sem explicações, Isabel desaparece. O namorado fica desesperado, mas percebe que fotos estão sendo atualizadas constantemente num tablet esquecido por ela em casa. Munido dessas imagens, ele percebe que sua amada partiu numa viagem de autodescoberta ao norte do país, e decide segui-la. Temos, portanto, dois road movies paralelos: o dela, de descoberta e expurgação dos traumas, e o dele, buscando seguir o trajeto preestabelecido.

    A estrutura é interessante, e bem costurada pelo diretor Fernando Lavanderos. Ele não deseja explicar as motivações profundas de cada personagem para a fuga. Pelo contrário, adota uma postura não psicológica, privilegiando fatos e ações. Estamos no território do deslocamento como finalidade em si: Isabel se move sem saber por quanto tempo, sem traçar um destino preciso, enquanto Estéban também não sabe o que dizer para ela quando eventualmente encontrá-la. De certo modo, ele busca compreender melhor a pessoa que ama pelos passos que ela seguiu, num investimento afetivo da geografia chilena.

    O cineasta aproveita para retratar espaços do Chile muito além da capital Santiago, alfinetando a pouca importância atribuída pelo governo às demais regiões. Ao mesmo tempo, evita transformar a jornada pessoal dos protagonistas num panfleto turístico, filmando praias nubladas e tristes, regiões paupérrimas e desertos pouco convidativos. Os espinhos emocionais de ambos são, de certo modo, representados metaforicamente pela natureza ao redor, a exemplo da cena em que um pedregulho leva a questionamentos sobre origens misteriosas de seus furos. Diz-se muito pouco, na verdade: Sin Norte prefere proporcionar sensações e explicações.

    As qualidades da narrativa são prejudicadas pela construção do personagem principal. Estéban é tristemente transformado em coadjuvante de sua própria história. Nunca temos tempo de vê-lo sofrendo pela perda de Isabel, nem por todas as coisas que deixa para trás quando abandona a casa e o trabalho para persegui-la. Sempre que faz encontros pelo caminho, as outras pessoas tornam-se o foco da imagem e do roteiro, deixando a Estéban o papel de ouvinte. Por um lado, esta escolha proporciona momentos belíssimos, como o encontro com uma pintora e moradora de rua (a cena mais comovente da obra inteira), mas faz do protagonista uma figura desinteressante, com atuação pouco expressiva de Koke Santa Ana.

    Mesmo assim, Sin Norte é uma obra competente em quesitos técnicos, e atenta aos perfis humanos espalhados por todo o país. Trata-se de um filme que observa com carinho a sociedade como um todo, embora não consagre a mesma atenção às necessidades e conflitos dos indivíduos que a compõem.

    Filme visto no 44º Festival de Cinema de Gramado, em setembro de 2016.

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