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    O Que Queremos para o Mundo?
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    O Que Queremos para o Mundo?

    Alternativas para a infância

    por Bruno Carmelo

    O Que Queremos Para O Mundo? é, antes de tudo, um projeto educativo mineiro, que pretende ouvir a voz das crianças e permitir a troca de ideias através de diversas formas de arte. A passagem ao longa-metragem, possibilitada por financiamento coletivo e efetuada por diversas pessoas que jamais trabalharam no cinema, poderia anunciar o pior – no caso, um vídeo institucional das ações pedagógicas do grupo ou uma ode à “magia de ser criança”, aquela idealização nostálgica típica do olhar adulto.

    Mas o filme é uma agradável surpresa. Ele se foca no universo pré-adolescente de quatro garotas, destacando as dúvidas e incertezas de Luz (Olívia Blanc), jovem com imaginação tão grande quanto suas angústias. O roteiro aborda com delicadeza a baixa popularidade e a ausência do pai, que pesam na carência afetiva da jovem. Por isso, ela se tranca no quarto, onde imagina um novo mundo, faz dobraduras. Elogia-se a introspecção de Luz sem tentar adequá-la ao ritmo acelerado da juventude contemporânea.

    Aliás, o ritmo do projeto é voluntariamente lento, contemplativo, com direito a múltiplas digressões na narração e na imagem. O Que Queremos Para o Mundo? vai na contramão das histórias multicoloridas e picotadas dos novos programas de televisão infantis, apostando numa poesia calma, melancólica, em tons pastéis. Os equipamentos eletrônicos possuem papel marginal neste universo essencialmente analógico. O roteiro valoriza o origami, a música, e mesmo quando a textura da imagem se torna mais digital (caso dos trechos em animação), aposta-se em formas geométricas de notável simplicidade.

    A arte aparece como melhor forma de expressão para a juventude. Luz encontra vazão às suas pulsões da puberdade através de um trabalho de escola, com a ajuda das colegas Sol, Bela e Lua. Como se percebe, o discurso artístico e cultural vem acompanhado de forte teor místico e neohippie, do tipo que privilegia a conexão com a natureza e com sentimentos coletivos. Enquanto os discursos conservadores propõem o diálogo transcendental através da religião, esta narrativa na qual Deus não é citado prefere uma ligação superior com a natureza.

    O filme sofre com diversos problemas devido à inexperiência dos envolvidos e ao baixíssimo orçamento. Quando as quatro jovens chegam ao sítio, na metade final, a mixagem de som se perde totalmente na inclusão da trilha sonora, que abafa os diálogos. A excessiva narração em off também incomoda, por repetir significados que a imagem já transmite sozinha. Em especial, é frustrante construir toda a narrativa em torno de uma apresentação musical que não se vê: quando a Banda da Casa da Árvore finalmente apresenta sua canção, as meninas são substituídas por uma espécie de “lyric video” martelando a curtíssima letra da canção, composta por meia dúzia de palavras.

    Mesmo assim, O Que Queremos Para o Mundo? cumpre o papel de instigar reflexão de maneira lúdica, sem tentar oferecer uma resposta precisa à pergunta-título (ainda bem). Suas maiores ingenuidades estão no aspecto técnico, e não humano, algo que pode ser compreendido num projeto coletivo como este. O filme funciona para seus criadores exatamente como a música funciona para as personagens: é a proposta de se arriscar numa arte que os autores não dominam bem, mas executam com sinceridade e empatia.

    Filme visto na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2016.

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