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    A Noite Escura da Alma
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    A Noite Escura da Alma

    Filme de terror

    por Bruno Carmelo

    A Noite Escura da Alma é um documentário poético de Henrique Dantas que, literalmente, joga luz na questão da ditadura militar no Brasil. Partindo de silhuetas escuras dos entrevistados, como Juca Ferreira e Lúcia Murat, o diretor começa aos poucos a iluminar seus rostos, sincronizar o som de suas imagens com seus discursos e colocar em foco o passado sombrio de repressão e violação dos direitos humanos.

    O primeiro mérito do filme é provar que ainda estamos distantes de esgotar o tema ou a forma relacionada a este período histórico brasileiro. Começando com uma narração em primeira pessoa, o cineasta mostra como sua vida foi impactada pelos sombrios anos 1960-70, ilustrando os depoimentos de tortura com encenações de dança e artes plásticas. Enquanto o retrato dos entrevistados, com suas vozes fora de sincronia, gera interessante efeito de distanciamento, as performances fornecem elementos poéticos destinados a representar a força dos episódios narrados.

    As melhores performances artísticas são as menos realistas: Dantas enquadra peles espremidas contra superfícies transparentes, ensanguentadas, gerando texturas próximas da abstração, mas capazes de ilustrar com clareza a clausura e o sofrimento. Já as criações diretamente dependentes do referencial (os corpos empilhados no chão, as bocas presas e corpos amarrados) tornam-se mais fracas pela previsibilidade. Mesmo assim, o conjunto poético possui um vigor estético notável, catalisado pela montagem capaz de traçar uma narrativa linear e cronológica através das criações artísticas.

    A Noite Escura da Alma não se limita à denúncia. O documentário efetua uma reflexão aprofundada, desde as condições históricas que permitiram a tomada de poder pelos militares até os eventos que levaram ao retorno da democracia. Focando-se nos casos de tortura na Bahia, o filme vai além e sugere que a ditadura existe até hoje, pelo silêncio de políticos e cidadãos diante dos atos de violência, assim como pela transformação da política em tema tabu. Critica-se ao mesmo tempo os políticos de direita, defensores do retorno à repressão, quanto os governos Lula e Dilma, que não investigaram os casos a fundo e ainda mantêm estruturas herdeiras desse período. No caso da Bahia, as menções explícitas aos assassinatos comandados por Antônio Carlos Magalhães são perturbadoras.

    Com este projeto, Henrique Dantas consegue unir duas formas de olhar que nem sempre caminham juntas no documentário histórico: a restituição e a criação artística. Ao mesmo tempo que se desconstrói clichês e imagens preconcebidas sobre a tortura, constrói-se elementos que, na impossibilidade de transmitir a dor exata das vítimas, representam de maneira assombrosa as suas trajetórias.

    Filme visto na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2016.

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