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    Futuro Junho
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Futuro Junho

    Filme da crise

    por Bruno Carmelo

    O documentário de Maria Augusta Ramos possui um tema tão importante quanto amplo: as desilusões dos brasileiros e a crise econômica nacional às vésperas da Copa do Mundo de 2015. Como retratar uma conjuntura ao mesmo tempo social, econômica, política, cultural e artística num único projeto? Como associar a bolsa de valores na China, a greve dos metroviários nas ruas e as medidas políticas do governo Dilma?

    O primeiro mérito de Futuro Junho é perceber que todos esses elementos estão, de fato, interligados. Contra o pensamento redutor de quem acredita que todos os problemas são culpa de um ou outro político, Ramos mostra como tantos fatores contribuem ao sucesso ou fracasso da economia de um país. Para isso, a cineasta vai das esferas mais altas, investigando medidas do governo e conjunturas internacionais às camadas populares, destacando pequenos trabalhadores que vivem com renda de um salário mínimo.

    O filme tenta representar a diversidade nacional através de quatro personagens paulistas: um economista progressista, um motoboy com talento para rapper, um peão da indústria automobilística e um sindicalista, líder da greve dos metrôs. Não é à toa que todos estes representam a voz do povo: Futuro Junho não esconde o seu discurso político de esquerda, engajado, destinado tanto a apresentar as fissuras do sistema quanto ressaltar as melhorias visíveis dos últimos doze anos.

    Escolher apenas quatro pessoas pode parecer redutor, mas metodologicamente falando, este recorte se fazia necessário – quaisquer quatro escolhidos passariam a mesma impressão de reducionismo. Não ouve a voz dos grandes empresários, cujos interesses são bem representados pela grande mídia: mostra-se, justamente, o outro lado da moeda, aquele avesso ao catastrofismo que se tornou o ganha pão dos grandes jornais conservadores no Brasil.

    O roteiro está repleto de boas ideias: quem pensaria, diante de um tema tão complexo, em filmar seus personagens em ações do dia a dia, tomando café com os filhos ou jantando com a esposa? Futuro Junho tem o trabalho de humanizar a discussão, retirando-a do campo teórico e trazendo-a para perto das experiências de cada espectador. Em outras palavras, cria histórias com as quais o público possa se identificar. Por isso, o ritmo é agradável, equilibrado: para cada discussão teórica, voltamos a um jogo de cartas do motoboy com seus amigos, relembrando que a macroeconomia pode ser um tema bastante pessoal.

    Por outro lado, o projeto é prejudicado por suas intenções didáticas. Os momentos de intimidade filmados por Maria Augusta Ramos são claramente encenados para a câmera – talvez não roteirizados, mas pelo menos reproduzidos para o olhar da diretora, que cria as cenas com enquadramentos próximos, planos e contraplanos, algo impossível no documentário de observação. Interfere-se diretamente naquele ambiente, dando a sensação de um discurso artificial, mesmo forjado: parece muito estranho ver o casal jantando e discutindo o preço de fabricação de peças na China, ou a família sentada na sala de estar discorrendo sobre os custos da Copa do Mundo.

    Do mesmo modo, a montagem nunca consegue associar plenamente todos os temas em jogo. Sabemos que a angústia da Copa do Mundo, a violência policial do governo Geraldo Alckmin e o preço dos jazigos em cemitérios estão relacionados, mas temos a impressão de assistir a um projeto com ideias demais, que nem sempre dialogam umas com as outras. Futuro Junho constitui uma avalanche de considerações válidas sobre São Paulo e sobre o Brasil, mas sua força é atenuada pela pedagogia do discurso, pela exemplaridade excessiva das cenas.

    Filme visto na 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em janeiro de 2016.

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