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    Betinho - A Esperança Equilibrista
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Betinho - A Esperança Equilibrista

    O Brasil que sonha

    por Francisco Russo

    Herbert José de Souza, ou simplesmente Betinho. Sociólogo, militante, hemofílico, exilado, aidético, ícone. Para muitos, um exemplo. Para alguns, um herói - palavra esta tão banalizada nos dias atuais, na contínua (e um tanto quanto desesperada) busca de alguém que possa nos salvar. Um sonhador, com certeza. Prestes a completar 80 anos, sua vida e obra ganham destaque através do documentário Betinho - A Esperança Equilibrista, exibido na mostra Première Brasil do Festival do Rio 2015. Um filme simples no formato, mas com uma mensagem tão poderosa que emociona.

    Dirigido por Victor Lopes, do emblemático Língua - Vidas em Português, Betinho segue a fórmula tradicional dos documentários biográficos, mesclando muito material de arquivo com depoimentos de pessoas importantes em sua trajetória. O fio condutor é uma longa entrevista concedida pelo próprio homenageado nos anos 1990, onde fala abertamente sobre os momentos difíceis que viveu: da tuberculose ainda criança à perseguição política durante a ditadura, que fez com que fosse exilado por oito anos. Do interesse cada vez maior pelos ideais da esquerda ao relacionamento com os filhos, com todos os problemas decorrentes da clandestinidade e da vida fora do país. Fatos que se mesclam à própria história do Brasil (e, em um pequeno trecho, do Chile também), apresentados de forma linear, para facilitar a compreensão do espectador.

    Em meio a tantos momentos importantes, duas características saltam aos olhos: a luta constante pela vida, já que a hemofilia e, posteriormente, a AIDS eram atestados de óbito sem data marcada; e a crença no poder da sociedade como veículo de transformação. É nestes dois pontos que o documentário ganha importância. Se os momentos relacionados ao exílio e ao regresso ao Brasil são emocionantes por natureza, por todo o simbolismo que representa a liberdade reconquistada em um país que vivia o peso da ditadura - é impossível não se arrepiar com o desembarque no Rio de Janeiro  -, é no ativismo social que o Brasil sonhado por Betinho enfim ganha corpo. Aquele que não depende apenas do governo, em que as pessoas estendem a mão para eliminar o lado mais feio do capitalismo, que cria pobreza e miséria. Aquele que acredita que sim, é possível viver em um país melhor.

    Nos dias atuais, em um cenário político caótico e moralmente devastador, o documentário surge como um libelo à esperança. Um lembrete de que sim, é possível sair das trevas do conservadorismo e levar uma vida mais digna e justa, enfrentando os inevitáveis problemas tendo como baluartes maiores a ética e a perseverança. É o exemplo de vida de Betinho, pelo que superou e na crença transmitida de forma tão natural e bem humorada, que bate forte ao término da sessão, ao ponto de, mais uma vez, acreditar. Sim, o sonho é possível.

    Betinho - A Esperança Equilibrista pode até ser um documentário conservador no formato, sem inovar na narrativa, mas traz consigo uma mensagem tão forte que é impossível passar despercebido por ele. Mas sem heroísmo ou santificações. Se Betinho pode até ser apontado como um farol pelos ideais que pregava, seu maior ensinamento é que o salvador, na verdade, é cada um de nós. Faça a sua parte.

    Filme visto no 17º Festival do Rio, em outubro de 2015.

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