O que querem os jovens?
por Bruno CarmeloNa filmografia brasileira recente, a maioria dos filmes feitos para adolescentes e sobre adolescentes buscaram adotar um estilo pop, com cores vibrantes, muita trilha sonora e mensagem otimista. O cinema brasileiro já produziu bons títulos nesta verve, como Meu Tio Matou um Cara e As Melhores Coisas do Mundo. Mas obras recentes, como Beira-Mar, Depois da Chuva e Hoje Eu Quero Voltar Sozinho devolvem à juventude seu aspecto sério e introspectivo.
Beira-Mar retrata a viagem dos jovens gaúchos Martin e Tomaz rumo ao litoral, para resolverem assuntos relativos a uma herança. Diversas informações são escondidas do espectador, como a relação dos garotos com seus pais e um com o outro. Mas aos poucos, os diretores Filipe Matzembacher e Marcio Reolon explicam o mínimo necessário para que esses personagens se tornem complexos, e sua jornada seja compreensível ao público.
Ao invés de mostrar as ações da dupla, o filme prefere os instantes de silêncio, quando se sentam em uma praça vazia, ficam sozinhos na casa isolada ou presenciam o silêncio numa roda de amigos. Esta é uma história feita de desconfortos, de tempos truncados: são os momentos aparentemente banais que a dupla de cineastas busca transformar em instantes dignos de interesse.
Em grande parte, a intenção é alcançada. Os diálogos reproduzem falas comuns a esta faixa etária, enquanto as posturas corporais desleixadas dos atores condizem com a direção naturalista. Os atores Mateus Almada e Mauricio José Barcellos parecem pouco experientes, mas esta expressividade crua se encaixa bem no projeto. Às vezes a fotografia insiste demais em brincadeiras com a profundidade de campo e com imagens através de reflexos, mas de modo geral, o conjunto transmite uma bem-vinda naturalidade.
Do mesmo modo, o sexo é mostrado de maneira bela e respeitosa. Embora a idade dos personagens possa causar confusão – eles parecem pré-adolescentes em seus joguinhos caseiros, mas são adultos na atitude tranquila em relação ao sexo -, os diretores fazem questão de não ocultar a intimidade natural entre Martin e Tomaz. Determinadas cenas como a revelação da homossexualidade de um dos garotos ganham um clima descomplicado, mesmo que alguns instantes engraçados – o jogo de videogame filmado como possível masturbação – destoem do tom da obra.
Ao buscar os tempos mortos e diálogos banais, Beira-Mar não evita o tom inerte em sua dramaturgia. Há uma constante sensação de que “nada acontece”, tanto em termos de conflitos narrativos quanto na ausência de tensão inerente às cenas. Os diálogos tornam-se retóricos, em frases como “Meu pai me batia / Devia ser foda / Pois é”, ou “Foi mal / Não tem problema / Beleza.” Os poucos temas abordados pelos personagens não se desenvolvem, o que desperta uma sensação de monotonia e linearidade voluntárias, mas excessivas.
Mesmo assim, este drama parte da notável vontade de tratar a adolescência e a sexualidade a partir de uma combinação dosada de leveza e seriedade, de realismo e estetismo. Assim, Beira-Mar se apoia na beleza do cotidiano, na poesia dos dias simples e nublados.
Filme visto no 65º festival de Berlim, em fevereiro de 2015.