A franquia amadureceu
por Renato HermsdorffA idade fez bem para a franquia Meu Passado Me Condena. Não que tenha passado tanto tempo assim desde que o primeiro filme baseado na série de TV estreou em 2013. Não que Meu Passado Me Condena – O Filme seja uma produção de baixa qualidade. Porém, com a chegada agora de Meu Passado Me Condena 2, mantém-se a dinâmica bem-humorada e de apelo popular do casal Fábio (Fábio Porchat) e Miá (Miá Mello), desta vez envolvido em situações mais críveis do que em 2013.
Ambos os filmes de Julia Rezende, que tem se mostrado firme na direção, se destacam, em primeiro lugar, pelo que não são: não têm escatologia, fogem da piada óbvia (se passa em Portugal e não em piada “de português”), o humor é mais verbal do que físico, não têm Leandro Hassum perdendo dinheiro nem Rodrigo Sant’anna vestido de mulher – e ainda assim, é uma comédia nacional.
Outro mérito, mais direto, é que a sequência vem embalada em papel para cinema. Fotografia e luz (que valorizam as locações que fogem do lugar-comum de Quinta de Sant'Ana, no Gradil, e em Sortelha, um vilarejo com apenas 200 habitantes) e figurino são de um capricho raro no gênero, no Brasil.
A estrutura é basicamente a mesma do primeiro filme: crise, um casal extra que se interpõe entre a dupla central, uma viagem ao exterior. Mas, se lá atrás, ficava difícil acreditar, por exemplo, que Miá não tivesse conseguido desmentir para a madrinha (Catarina Abdalla) que seu verdadeiro marido não era Beto (Alejandro Claveaux), o roteiro da sequência - escrito por Tati Bernardi, Leandro Muniz e Patricia Corso (que também assinam o texto do outro longa) - é, desta vez, menos fantasioso no que se refere aos episódios que cercam o casal.
Agora, eles vivem, aos três anos de relacionamento, a famosa “crise dos sete anos”, uma boa sacada, haja visto que as relações hoje em dia são muito mais superficiais e as pessoas abrem mão da união praticamente no primeiro problema. Em razão da imaturidade de sempre de Fábio, Miá decide se separar do crianção. Porém, a notícia da morte da avó do protagonista, em Portugal, amolece o coração da moça e ela decide embarcar com o parceiro para a terrinha, no que Fábio enxerga uma chance de reconquistá-la. Lá, ela vai entrar em contato com o passado dele: conhecer Alvaro (Ricardo Pereira), o valentão que praticava bullying, e Ritinha (Mafalda Rodiles, ótima), primeira namorada de Fábio, que hoje formam um casal.
Como a grama do vizinho parece sempre mais verde – ainda mais em Portugal –, assim como o Beto do primeiro filme, Alvaro parece assumir o papel do provedor com o qual Miá sempre sonhou – e que Fábio nunca foi. A comparação é o ponto alto do filme porque, superados os clichês da crise matrimonial (ele esquece de pagar a conta de luz, ela é mandona; ele esquece a data de aniversário de casamento e vai jogar futebol; ela é mandona) na apresentação do filme, o que se segue é uma discussão mais madura a respeito da natureza das relações amorosas. Sem perder a piada, claro. O contraponto dos casais (expectativa X realidade) é uma forma eficaz de dar sustância à comédia.
Da história, o ponto fraco é o casal de trambiqueiros Wilson e Suzana. Vindos do primeiro filme (e da TV), por se tratar de uma continuação, a produção parece ter se visto na obrigação de incluí-los. E, embora partindo de uma boa solução (eles agora administram uma funerária no além-mar), mesmo bem conduzidos por Marcelo Valle e Inez Viana, eles sobram como “alívio cômico” (veja só!) do filme. O retorno de Cabeça (Rafael Queiroga), por outro lado, garante um dos momentos mais hilários.
Meu Passado Me Condena 2 pode não trazer o enredo mais original do qual você já ouviu na vida, mas estamos falando de uma comédia e que, como tal, é muito superior ao que se tem produzido no Brasil. A franquia amadureceu.