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    Pierrot Lunaire
    Críticas AdoroCinema
    1,0
    Muito ruim
    Pierrot Lunaire

    Inveja do pênis

    por Bruno Carmelo

    A carreira do diretor Bruce LaBruce é curiosa: depois de se estabelecer como um dos principais ícones do cinema queer e underground, misturando sexo explícito ao cinema de gênero (com muito sangue, zumbis e monstros), ele decidiu passar ao cinema “sério”, com produções de arte que circulam em grandes festivais. O primeiro resultado desta guinada foi o fraquíssimo Gerontophilia, romance pouco verossímil entre um adolescente e um homem idoso à beira da morte.

    Em Pierrot Lunaire, LaBruce parte para referências ainda mais eruditas: ele se apropria das canções compostas por Arnold Schönberg para os poemas de Albert Girault. A estética também adentra cânones cultos, no caso, o cinema mudo, em preto e branco, com intertítulos no lugar dos diálogos. O cineasta decide trazer outra versão ao Pierrot: agora, trata-se de uma transexual (Susanne Sachsse) que esconde da namorada o fato de não ser um homem cisgênero. Quando é descoberta, Pierrot começa a busca obsessiva por um pênis, que supostamente faria dela um homem completo.

    A subversão de gêneros poderia ser interessante, mas a obra incomoda tanto na forma quanto no conteúdo. O tom excessivo das imagens é duro de suportar: o filme apresenta uma narração raivosa e ininterrupta dos poemas, somada à música, às ações teatrais, às sobreposições digitais (de uma lua gigante, de flares, de alucinações), aos intertítulos (mais de vinte capítulos em cinquenta minutos), aos elementos coloridos no preto e branco... Existem recursos demais, máscaras e camadas demais, compondo um banquete que se satura rapidamente.

    Quanto à história, sugere-se que a relação entre duas mulheres (ou uma mulher e uma trans) só poderia acontecer com a presença de um falo, ou seja, a trans FTM (mulher para homem) precisaria de um pênis para ser completa. Esta obsessão permeia todo Pierrot Lunaire, sem constatações ou questionamentos. Seguem então cenas de membros cortados, guilhotinados, implantados... LaBruce permanece trash, mas a apropriação do dito cinema “refinado” só revela sua inaptidão à linguagem cinematográfica tradicional. Depois de Gerontophilia, muitos pensavam que o diretor não seria capaz de fazer nada pior. Mas ele continua se superando.

    Filme visto no Rio Festival Gay de Cinema, em julho de 2015.

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