Mulher precisa ter curvas
por Bruno CarmeloO cinema americano tem ressuscitado nos últimos anos as comédias lideradas por duplas femininas, graças ao talento de atrizes como Sandra Bullock e Melissa McCarthy (As Bem-Armadas), Kristen Wiig e Maya Rudolph (Missão Madrinha de Casamento) ou Amy Poehler e Tina Fey (Uma Mãe Para o Meu Bebê). A ideia é brincar com as convenções do gênero, sugerindo que as mulheres podem ser tão grosseiras, infantis, violentas ou interessadas em sexo quanto qualquer homem – e, paralelamente, os homens podem ser tão sensíveis, inseguros ou delicados quanto qualquer mulher.
Neste cenário levemente subversivo, a comédia Belas e Perseguidas representa um retrocesso. A história gira em torno de uma policial rígida e pouco atraente (Reese Witherspoon) encarregada de viajar pelos Estados Unidos com uma testemunha desbocada e sedutora (Sofía Vergara). Este é um mundo de opostos: ou você é linda, ou é horrível, ou parece uma mulher (entenda: bem depilada, seios fartos, salto alto, decote), ou parece um homem (uma delas coloca uma peruca curta e é imediatamente confundida com um jovem garoto). O único alvo de riso são as mulheres, e o filme possui uma cartilha muito clara de como elas deveriam se comportar para serem representantes dignas de seu gênero.
Além do machismo à moda antiga (logo num filme dirigido por uma mulher, Anne Fletcher), o roteiro traz reviravoltas fraquíssimas. A investigação policial avança através de indícios envolvendo tatuagens de vacas, sapatos especiais, homem misteriosos dentro de carros e surpresas sobre a índole de alguns personagens. Tudo é abrupto, sem explicações, surgindo de modo fácil e acessório. Se as protagonistas não passam de clichês (a gostosa, a feia), os coadjuvantes são ainda mais superficiais. Rob Kazinsky nada tem a fazer nesta história além de encarnar o obrigatório interesse romântico, e Joaquin Cosio limita-se ao estereótipo do traficante mexicano.
É interessante que Belas e Perseguidas consiga ser ao mesmo tempo previsível e difícil de acreditar, ou seja, você já viu todas essas cenas mil vezes (personagens fugindo por janelas e caindo, entrando em festas fantasiados, seduzindo o inimigo com uma escuta no corpo), mas elas são feitas de maneira tão desengonçada que não parecem realistas dentro daquele contexto. Vergara gesticula demais, Witherspoon fala demais, é rígida demais (neste sentido, outra policial durona, Sandra Bullock em As Bem-Armadas, era muito mais verossímil). Os diálogos em excesso tentam compensar o ritmo lento da montagem (vide a gag sem graça do celular esmagado) e a pobreza da direção.
A duas atrizes já demonstraram diversas vezes que possuem bom timing cômico e dominam com facilidade o humor nos diálogos, mas o material de Belas e Perseguidas está aquém do talento de ambas. Elas são limitadas à persona que já interpretaram muitas vezes – Witherspoon como a garota psicorrígida de Eleição e Legalmente Loira, Vergara como a latin bombshell de Modern Family e Amante a Domicílio. Enfim, este é um filme fácil, apoiado em preconceitos gastos e saídas conhecidas. Pode divertir espectadores que procurarem o conforto da falta de surpresas, mas não deve deixar uma lembrança duradoura.