De volta ao espaço, Ridley Scott está em casa
por Renato HermsdorffSe você, saudoso fã deBlade Runner, o Caçador de Andróides, vivia cabisbaixo porque há tempos Ridley Scott não entregava um bom trabalho, seus problemas acabaram! Com Perdido em Marte, o diretor de Alien, o 8º Passageiro volta à melhor forma em termos de entretenimento.
Baseado no romance homônimo do escrito Andy Weir, o blockbuster começa no Planeta Vermelho, onde uma equipe de astronautas norte-americanos, chefiada por Melissa Lewis (Jessica Chastain), realiza um trabalho de campo. Até que uma tempestade repentina interrompe as pesquisas e eles têm de voltar imediatamente para a base.
Atingido por uma antena, o botânico Mark Watney (Matt Damon) é dado como morto e deixado para trás. Porém, sobrevive. E, até que o resgate chegue, vai demorar um intervalo de quatro anos, e ele tem que dar um jeito de se virar sozinho até lá.
Sem o tour de force de Gravidade(2013) ou o papo-cabeça de Interestelar (2014), The Martian (no original) é bem mais palpável.
Abandonado, o personagem precisa realizar uma dezena de cálculos, analisar dados e, sim, plantar a própria comida. E todo o aspecto técnico da empreitada é apresentado ao público de forma compreensível, traduzida da obra original pelo roteiro simples e, na medida do possível, conciso, de Drew Goddard (de Lost e Guerra Mundial Z).
Ao mesmo tempo em que Watney tenta estabelecer contato com a Terra, desenvolve um diálogo com as câmeras da nave (ou seja, com o público), numa espécie de diário, que é calcado em excelentes tiradas e muito bom-humor. (Sobra até para Neil Armstrong, o primeiro homem a pousar na lua). É um recurso narrativo fácil? Certamente. Mas que resulta na construção de um perfil bem claro (e divertido) do personagem, sobretudo baseado no otimismo e, paradoxalmente, na auto-depreciação.
Na Terra, caberá à NASA (onde trabalham os personagens de Chiwetel Ejiofor, Sean Bean, Kristen Wiig, entre outros), primeiro, anunciar a tragédia da morte do tripulante da missão, para depois ter que voltar atrás e o processo de resgate ganhar uma dimensão interplanetária, com transmissão ao vivo para o mundo inteiro – o que não deixa de ser uma crítica à espetacularização da mídia hoje em dia.
Assim, restará à equipe original de Mark – composta ainda pelos personagens de Michael Peña, Kate Mara, Sebastian Stan e Aksel Hennie –, no espaço em outra missão, a possibilidade de reparar o “erro” acidental, o que suscita um dilema moral do time, uma vez que o resgate é arriscado.
Embora previsível, a história transcorre o mais realista possível. Sim, em um dado momento, a agência equivalente da NASA na China se oferece para ajudar – afinal, o mercado chinês é importante para Hollywood. Mas não há nem sequer um vilão (seria o personagem de Jeff Daniels, diretor da NASA, mas não é bem assim) para embaralhar o salvamento.
Mesmo intuindo onde a história vai parar, a aventura é conduzida de maneira a que não sobre uma unha intacta do espectador na poltrona. E a fotografia ainda entrega uma sucessão de lindas imagens para o deleite da plateia. De volta ao espaço, Ridley Scott está em casa. (Prometheus não conta).
Filme visto no 40º Festival Internacional de Cinema de Toronto, em setembro de 2015.