Suspense sem suspense
por Sarah LyraÀ primeira vista, um thriller protagonizado por duas mulheres (sendo uma delas Isabelle Huppert) de diferentes faixas etárias, que precisam lidar com questões da idade, perdas e solidão, parece uma receita promissora para o sucesso. Por isso, acaba sendo ainda mais decepcionante assistir a Obsessão e constatar que o filme não apenas falha nos pontos que, naturalmente, seriam seus maiores desafios, como também naquilo que deveria tirar de letra.
Frances (Chloë Grace Moretz) é uma jovem que acabou de perder a mãe. Recém-chegada a Manhattan, ela divide apartamento com a amiga Erica (Maika Monroe) e trabalha como garçonete de um luxuoso restaurante. Um dia, voltando para casa, Frances encontra uma bolsa abandonada em um dos assentos do metrô, e, ao devolvê-la, acaba iniciando uma amizade improvável com a dona do acessório, uma viúva chamada Greta (Isabelle Huppert). Os problemas começam a surgir quando Frances percebe que a necessidade de atenção de Greta é muito mais perigosa do que ela imaginava.
Como mencionado acima, uma das características mais interessantes em Obsessão é que tinha potencial para funcionar bem, mas a dificuldade do roteiro em trabalhar nuances empobrece a produção como um todo, a começar pela interação entre as duas personagens principais. Para que uma identificação tão instantânea uma com a outra fizesse sentido, o contexto (e, principalmente, os subtextos) teria que ser muito mais bem aprofundado do que realmente foi. A sensação geral, ao final da projeção, é a de que sabemos tanto sobre as duas quanto no início da narrativa. E o mais grave é que, em algumas situações específicas, a produção parece ciente de suas lacunas, mas ao invés de tentar preenchê-las adequadamente, acaba usando artifícios baratos para enganar o espectador.
Isso fica evidente na cena em que Erica aponta o absurdo da afeição de Frances pela bolsa nunca vista antes e o ímpeto de levá-la para casa e procurar sua dona: “Se você está em Manhattan e encontra uma bolsa abandonada, você liga para o esquadrão antibombas”. Assim, fica difícil compreender as motivações da protagonista, principalmente porque ela faz questão de ressaltar que seu interesse na situação não é financeiro. Mais difícil ainda é digerir o fascínio das duas mulheres uma pela outra, a ponto de, já no terceiro encontro delas, prometerem amizade eterna. E quando o roteiro acha que está sendo sutil ao sugerir o que todos já haviam percebido, a natureza materna da relação, Erica entra em ação novamente e diz que os “mom issues” (problemas maternos) da protagonista são tão óbvios que chegam a ser tristes, o que, mais uma vez, soa quase como uma crítica ao próprio roteiro.
Outra questão problemática de Obsessão é que, em vez de trabalhar as razões que levaram à instabilidade emocional de Greta, o roteiro reforça a figura de “mulher louca” estereotipada, como se fosse a natureza dela e não pudesse ser evitada. A única cena que flerta com algum aprofundamento da personagem é a que faz referência ao relacionamento de Greta com sua filha Nicola, mas, no fim das contas, as informações sobre a família geram mais pontas soltas do que respostas.
Também não há qualquer tipo de impasse ou luto da parte de Frances ao perceber a natureza tóxica de Greta e se dar conta de que perdeu sua figura materna uma segunda vez. A relação, que supostamente era de amor e cuidado, facilmente se transforma numa caça que pouco acrescenta no desenvolvimento da trama. Como consequência do comportamento infundado de Greta, é difícil sentir medo por Frances, pois a sensação constante é a de que ela nunca está, de fato, em perigo.
Por fim, fica clara, principalmente nas cenas de perseguição, a tentativa do diretor Neil Jordan e do diretor de fotografia Seamus McGarvey de criar um clima de suspense, mas os esforços são facilmente neutralizados pela falta de coesão do roteiro.