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    Mato Sem Cachorro
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Mato Sem Cachorro

    Desconstrução

    por Francisco Russo

    A sequência de abertura de Mato Sem Cachorro é emblemática: uma família perfeita, passeando por uma praia carioca, apresentada como se fosse uma grande ilusão publicitária. Por trás da aparente tranquilidade há brigas, ciúmes e todo tipo de problemas que afetam a vida como ela realmente é. Esta desconstrução é o principal mote aplicado pelo diretor Pedro Amorim, que em seu primeiro longa-metragem opta por jogar por água abaixo certos mitos, seja com personalidades ou com o próprio gênero da comédia romântica. A começar pelo próprio casal protagonista, interpretado com competência por Leandra Leal e Bruno Gagliasso.

    Logo de início o público tem a chance de acompanhar como o introvertido Deco conheceu e se apaixonou pela despachada Zoé, tendo como inusitado intermediário o cachorro Guto. São cenas típicas de comédia romântica estreladas por um casal jovem, bonito e simpático, auxiliadas ainda pela fofura do bichinho de estimação querido por ambos, tudo isto apresentado em uma história simples, mas que funciona. Ou seja, o cenário está armado para que Mato Sem Cachorro siga a trilha convencional do gênero até entrar em cena um fator importantíssimo: Danilo Gentili. Ou melhor, o humor típico de Danilo Gentili. A partir deste momento, o filme passa por uma brutal transformação: de uma história leve ganha contornos mais pesados, não no sentido da tragédia mas no de grosseria. E, infelizmente, perde boa parte da diversão prometida pelos 15 minutos iniciais, quando o foco principal ainda era a comédia romântica.

    Não que o Leléo de Gentili não tenha seus bons momentos. É bem verdade que o personagem faz rir em situações como a da perseguição pelo anão e até pela rivalidade entre paulistas e cariocas aplicada em provocações ambíguas trocadas com o primo Deco, mas em compensação há um punhado de piadas e diálogos que, ao invés de provocarem o riso, causam constrangimento. E este peso não deve ser aplicado unicamente a Gentili, pois está também presente em outros personagens – Enrique Díaz que o diga, com seu visual canino como roupa de baixo.

    Por outro lado, há alguns aspectos bastante interessantes em Mato Sem Cachorro, boa parte deles relacionados à própria ideia da desconstrução. Por exemplo, tanto Gabriela Duarte quanto a cantora Sandy surgem em cena como personagens completamente diferentes da imagem que criaram em torno de si ao longo da carreira, o que causa uma surpresa positiva. Mais ainda devido à boa sacada do hobbie de Deco em misturar sons para criar algo novo, o que gera vídeos divertidos envolvendo a própria Sandy e ainda um “dueto” entre John Lennon e Michel Teló, apresentado logo no início do filme. A desconstrução, quando bem aplicada, acaba sendo uma força criativa que serve ao filme e também lhe traz um frescor de algo diferente do que tem sido feito nas comédias mais recentes do cinema brasileiro.

    Como um todo, Mato Sem Cachorro não é um filme ruim. Seu lado comédia romântica é bem feito e merecia até mais espaço dentro da trama, o filme conta com algumas brincadeiras divertidas tanto em cima de ícones quanto com diálogos pop – as citações vão de “Caverna do Dragão” às novelas de Manoel Carlos. Por outro lado, peca por ser um pouco longo demais e pelo exagero nas grosserias, que em várias cenas ameaçam jogar tudo por água abaixo. Ainda assim, Bruno Gagliasso e Leandra Leal conseguem segurar o filme, contando com o auxílio espirituoso de Letícia Isnard e Felipe Rocha. Fosse mais comédia romântica e menos humor grosseiro, o filme seria melhor.

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