Os ingênuos
por Bruno CarmeloA primeira metade deste filme se assemelha a uma comédia romântica comum. Uma garota encontra um garoto, e embora ambos tenham problemas familiares e profissionais, o amor magicamente soluciona esses conflitos. No caso, a cozinheira Mari (Fernanda Machado) tem as ambições profissionais sabotadas pelo patrão, o típico vilão de filmes dramáticos, e pela mãe, uma mulher rica e arrogante. Até conhecer Caio (Mateus Solano) durante uma degustação de vinhos, e os dois se apaixonarem.
A história segue a cartilha da progressão amorosa: primeiro beijo, primeira transa, morar juntos, comprar casa etc. A questão financeira entra em jogo quando ela é convencida pelo namorado a abrir o próprio restaurante. Caio se encarrega de fazer o pagamento de um casarão, mas acaba sumindo com o dinheiro. A perda da protagonista nem parece tão grande, afinal, não se trata das suadas economias de Mari, apenas do dinheiro que ela pediu à mãe e obteve, integralmente, do dia para a noite. O conflito principal criado por Confia em Mim é muito simples: quem é mais culpado na história? A garota incrivelmente ingênua ou o namorado ladrão?
O diretor estreante Michel Tikhomiroff apresentou seu filme no Festival de Paulínia 2013 com grande modéstia, dizendo se tratar de uma obra simples, despretensiosa, que esperava apenas não “fazer muito feio”. São palavras que descrevem bem este filme de ambições artísticas limitadas, mas que pelo menos evita a linguagem típica da televisão. Não há excesso de closes ou trilha sonora, apenas a cartilha cinematográfica mais tradicional, com planos de conjuntos quando os personagens estão juntos, planos próximos quando falam, movimentos de câmera quando se deslocam. Nenhuma imagem surpreende pela beleza, ousadia ou pela reflexão. Confia em Mim é um filme sem assinatura, sem traço autoral.
A humildade da história é combinada com a da direção. A partir da segunda metade, o filme se torna um suspense com fundo policial. As cenas de tensão são de uma simplicidade quase infantil, e o mesmo vale para os supostos planos de perseguição e apreensão por parte da polícia. Fosse conduzida com um pouco de humor, esta história pareceria uma comédia tosca, mas a grande seriedade da trama sugere que Tikhomiroff não deseja mais do que isso: fornecer um único elemento de suspense (será que Caio vai pagar por seu crime?) e resolvê-lo com detalhes bem explicadinhos, após um flashback didático para se certificar que o espectador perdeu nenhum detalhe – e olha que não existem muitos...
Pode-se felicitar Confia em Mim por ser um raríssimo suspense nacional, em uma cinematografia dominada por comédias escrachadas, e também por saber combinar as suas ambições com o tamanho da produção disponível. As funções técnicas, embora bastante escolares (direção de fotografia nítida demais, direção de arte limpinha e pouco orgânica), não comprometem o resultado, já as atuações contrastam o estilo contido de Fernanda Machado com as caras e bocas de Mateus Solano. Este é um suspense sem surpresas, mas que não ofende a inteligência do espectador. Pode vir a ser um bom programa na televisão (algo nada depreciativo), e um bom parceiro aos seriados policiais americanos que não entregam nada além disso: uma trama minimamente decente, que se complica e descomplica nas horas certas, proporcionando alguns minutos de distração antes de cair no esquecimento.