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    Cosmópolis
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Cosmópolis

    Um homem e sua limusine

    por Francisco Russo

    Cosmópolis é por muitos considerado o primeiro livro a retratar de forma fiel o século XXI. Não apenas pelo retrato do mundo corporativo, mas especialmente pela volatilidade dos mercados globais, a presença dos gênios que viraram milionários ainda muito jovens e o vazio interior que resulta na busca incessante por novas emoções. Todas características bastante restritas a um universo bem particular, representado no filme pela figura de Eric Parker. É através de suas manias, dúvidas e anseios que a história caminha, aparentemente sem rumo definido.

    Um dos aspectos mais interessantes do filme é a relação de Parker com sua limusine. O carro não é apenas um veículo de locomoção, mas uma espécie de bolha que lhe permite acompanhar tudo que acontece ao redor – de uma manifestação anticapitalista ao funeral de seu cantor de rap predileto. Lá ele recebe pessoas, conversa, transa, urina e até mesmo faz exames médicos. Entra na limusine apenas quem Eric permite ou convida, sendo uma representação quase literal de seu próprio mundo. O chefe de segurança, que a todo instante manifesta sua preocupação com o patrão, é um dos excluídos, tendo a chance de conversar com ele mas jamais de adentrar seu mundo. Não é à toa que, em determinado momento, é descartado tão facilmente. Eric, na verdade, não se importa com ele.

    Tamanha arrogância é também explicitada no modo como o personagem lida com as ameaças à sua volta: com um sorriso no rosto, como se elas o divertissem. Afinal de contas, é isso que Eric busca: entretenimento para ocupar as horas do dia, de forma a diminuir o imenso vazio que carrega consigo. Uma sensação que ele conhece bem mas não revela a ninguém, já que poderia transmitir fraqueza. Tamanha consciência, aliada à certeza do fracasso iminente devido a um erro de avaliação profissional, impulsiona Eric cada vez mais numa jornada de destruição, onde ele próprio se coloca em situações de risco à espera de algo, ou alguém, que o elimine de uma vez por todas. Apenas desta forma o vazio pode chegar ao fim.

    Toda esta jornada é transmitida pelo diretor David Cronenberg através de diálogos densos, repletos de frases a pensar, que abordam temas profundos como o capitalismo e o mercado global. Há um vasto simbolismo explorado, desde a figura do rato como "moeda mundial" até a exploração da nudez de uma das parceiras de Eric – é a luxúria lhe trazendo a necessária emoção de momento. Um contexto ao qual Robert Pattinson se encaixa bem, por não lhe exigir transmitir muitas emoções. Seu Eric Parker é seco e cínico, na medida exata para o personagem. Além disto, Pattinson estrela uma cena marcante, quando passa por um exame de próstata dentro da limusine. Seu rosto de desconforto em meio à luta para manter fluente a conversa com uma de suas assessoras chama a atenção.

    Diante de tanta informação cifrada e a ausência de uma narrativa linear, ao menos nos moldes convencionais aos quais Hollywood costuma seguir, Cosmópolis é um filme a ser compreendido aos poucos. É natural que, após a sessão, o filme cresça ao ser relembrado pelo que representa e também pelos temas abordados, apesar de seu ritmo por vezes lento e pelo final um tanto quanto teatral. Um bom filme, que merece ser visto e refletido.

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