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    45 do Segundo Tempo
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    45 do Segundo Tempo

    A busca pelo sentido da vida

    por Nathalia Jesus

    Quase como a fórmula de Gente Grande com pitadas generosas de niilismo, 45 do Segundo Tempo nos transporta para uma jornada de nostalgia e discute o propósito em estar vivo. É um longa-metragem que aborda o suicídio por uma ótica simplista, liderado por Tony Ramos e um time de grandes craques da televisão brasileira, mas consegue gerar reflexão sobre uma coisa ou outra.

    No filme, Pedro Baresi é dono de um restaurante italiano fundado pelo falecido avô. Sem nenhum laço de amizade ou amoroso, vive sozinho com sua cachorra chamada Calabresa, tocando um negócio há muito falido e repleto de dívidas para pagar. Um dia, ele é chamado para replicar uma foto com seus antigos amigos, tirada na inauguração do metrô em 1974 e é surpreendido pela notícia de que um dos rapazes do grupo morreu.

    É quando começa a pensar no sentido de sua própria vida e no quanto sua existência colabora para o funcionamento do mundo. Com a subsequente morte de Calabresa, sua única companheira da vida, Pedro decide reunir seus únicos dois conhecidos da época da escola (os mesmos que tiraram a foto no metrô), com um excelente almoço, para avisá-los que vai se matar e que, antes disso, precisa ver o Palmeiras ser campeão.

    Um pouco de Pedro Baresi em cada um de nós

    Apesar da temática, não nos deparamos com nenhum assunto sobre depressão em 45 do Segundo Tempo, nem a simples menção e, muito menos, o aprofundamento da pauta. O que o filme traz como reflexão é a necessidade de um pedido de ajuda ser ouvido, interpretado e, por fim, a importância de se mostrar disponível.

    Pedro Baresi não é um personagem que ficará marcado em nossas mentes quando pensamos nos infortúnios causados pela depressão. Ele nos impacta muito mais quando refletimos sobre solidão, a perda de amigos ao longo da vida e a nostalgia de uma época em que tudo era muito mais fácil e divertido.

    Ao lado de Ivan (Cássio Gabus Mendes) e Mariano (Ary França), amigos que não via há 40 anos, Pedro contempla o passado como se fosse um espectador na janela, sem jamais pensar que pode viver tal felicidade novamente, mas querendo sentir novamente essas emoções. Nesse ponto, não é difícil entender os desejos do protagonista, porque conseguimos sentir o que ele sente quando olhamos para trás, em uma época que nossas pessoas mais queridas estavam vivas, ao nosso lado, e que o peso da responsabilidade não caía sob nossos ombros.

    Tony Ramos é uma lenda da televisão brasileira, inegavelmente experiente e, desde o primeiro momento, conseguimos enxergar a verdade que esse personagem tão simplório tem a nos ensinar (ou espelhar). No entanto, também é difícil digerir quando ele diz, com tanto bom humor na voz, que está prestes a tirar a própria vida. E não apenas pela revelação chocante, mas pela naturalidade e equilíbrio em que lida com isso — tornando o momento, de alguma forma, desconfortável e pouco crível.

    O tom utilizado em toda a cena do anúncio dos planos do protagonista nos faz pensar que o filme vai cair no erro de retratar errônea e insensivelmente a questão do suicídio, mas esse desânimo nos abandona quando notamos que o roteiro não tem nenhuma intenção em tirar sarro de uma situação tão grave. A princípio, a ausência do debate sobre depressão causa estranhamento, considerando que, do ponto de vista de qualquer espectador leigo no assunto, a doença pode estar intimamente conectada ao ato de tirar a própria vida.

    No entanto, o longa-metragem delineia os efeitos (e não a causa) do sentimento de vazio interno e nos surpreende positivamente pela delicadeza em que aborda o lado interior de Pedro, dando validade à sua dor e respeitando seu processo — apesar de ser muito raso para a temática em comparação com outros longa-metragens como As Vantagens de Ser Invisível e Canção da Volta.

    45 do Segundo Tempo reflete a importância de ouvir

    Ao assistir 45 do Segundo Tempo, também nos pegamos impressionados pela sensibilidade em que Ivan e Mariano lidam com a decisão de Pedro. É um trio que cativa justamente por serem tão opostos e, ao mesmo tempo, complementares. Ary França, intérprete de Ivan, sabe andar pelos limites da comédia irreverente e da delicadeza, gerando o alívio cômico que somente um padre que xinga palavrões e bebe álcool poderia trazer a uma trama repleta de discussões existencialistas.

    Cássio Gabus Mendes, por outro lado, dá vida a um personagem muito menos interessante, com uma história genérica que poderia estar em qualquer filme, série ou novela que possamos imaginar. E isso não é sua culpa, mas ele acaba se tornando a figura que atiça o mínimo de curiosidade a quem assiste. Ainda, sim, não podemos imaginar Pedro sem a ajuda de alguém com o pulso firme de seu personagem, ou com os toques de humor de Ary França, fazendo com que a junção das três personalidades funcione bem.

    A força desse trio começa a ganhar forma quando nos mostram — ou, praticamente, desenham — a importância de ouvir o outro, ao invés de apenas expôr suas próprias opiniões e visões de mundo. A partir disso, o roteiro quase nos subestima, enquanto espectadores, com diálogos expositivos e cíclicos sobre alguns dos principais ensinamentos do filme: ter empatia e estar atento às necessidades do outro. Tudo isso em sacadas inteligentes que comparam a vida com uma partida de futebol, fazendo jus ao amor do protagonista pelo esporte.

    Os três personagens principais nos confrontam com discussões sobre o propósito da vida, o sentido de estar apenas respirando e sobrevivendo, a necessidade de estender as mãos. Nesse ponto, o filme se sustenta nessa busca pela finalidade de existir e nos prende em uma cronologia que, por fim, não nos apresenta nada surpreendente e, em alguns momentos, caminha muito para chegar a lugar nenhum.

    Vale a pena assistir ao filme estrelado por Tony Ramos?

    45 do Segundo Tempo é um filme linear, facilmente palatável e nada na superfície em um assunto que jamais conseguiríamos imaginar sendo tão reduzido. A falta de aprofundamento, no entanto, não torna a produção menos interessante. Faz o espectador se sentir mais confortável em refletir sobre questões existenciais ao se afastar da tragédia.

    Para fins de comparação, o filme parece uma versão mais madura de Gente Grande, sem a presença do humor pastelão de Adam SandlerChris Rock — o que seria de muito mal gosto, dado à temática sensível do longa-metragem brasileiro. Por fim, o que poderia ser um inimigo, mas se tornou o maior triunfo de 45 do Segundo Tempo, é a simplicidade, cuja trama segue um caminho seguro até o desfecho, garantindo uma história bem amarrada e emocionante.

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